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Livro 5

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Eu ainda estou aqui

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O dia está tão bonito, que insisto em olhar para o horizonte querendo esquecer a trágica notícia que acabei de receber. De uma hora para outra, o meu mundo desabou por completo. Um câncer… Venho para realizar meus exames de rotina e descobri que tenho, nada mais que oito meses de vida. Oito meses, o que faço em oito meses?! Minha mãe sequer conseguiu sair do consultório médico, enquanto eu, em meio ao pânico corri pelo hospital, até chegar ao lado de fora. Confesso que já quis morrer em algum momento, mas agora que tenho data marcada, me assusta um pouco. Quando olho para trás e vejo que minha mãe se aproximava de mim, volto a correr, quero me afastar dela a todo custo, mesmo que no final desse dia, o colo dela seja o meu melhor aconchego. De repente, sem conseguir evitar, esbarro em um rapaz que andava pela calçada distraído. - Ei, maluca, você não tem olhos? Perguntou e continuou andando, sem que eu conseguisse me desculpar. Me desculpar… Por quê eu me desculparia? Sou eu quem estou destruída! O que é um simples empurrão, perto do que acabei de saber?! - Anny? - Ouço a voz da minha mãe e percebo que acabei não saindo do lugar depois que esbarrei naquele cara antipático - Filha, por favor, olhe para a mamãe! Sinto sua mão se aproximando do meu braço e sem dizer uma palavra, me viro e abraço minha mãe chorando, ela se ajoelha ao me ver fazendo o mesmo,

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ficamos ali na calçada e eu sinto como se tudo estivesse mais lento, menos meus pensamentos. Eles parecem girar em torno daquelas palavras, aquelas malditas palavras. - Senhorita Anny Thompson, você tem um tipo raro de tumor cancerígeno no cérebro, infelizmente o tratamento só adiará o inevitável, você morrerá daqui oito meses! - Mesmo que o doutor tenha sido mais gentil com as palavras, foi assim que eu entendi. Volto para o carro com minha mãe, ela não diz nada, mas o brilho de seu olhar se apagou, eu a conheço e sei que se manterá forte para que eu não desabe de vez. Se ela soubesse que o que mais me assusta, é não saber como ela e meu pai ficarão após a minha partida. Mesmo não sendo a única filha do meu pai, sou filha única da minha mãe, os dois se casaram um pouco antes do meu nascimento, ou seja, são quase 18 anos de união. Quando abro a porta da minha casa, vejo meu pai sentado em sua poltrona marrom favorita, sinto vontade de pular em seu colo, o abraçar e chorar até não poder mais, mas a última coisa que quero, é mostrar o quanto estou com medo, então eu apenas olho para o jornal em suas mãos e subo as escadas o mais rápido que posso. Ele se levanta rapidamente, ouço minha mãe contar tudo em meio às lágrimas, e só consigo me sentir culpada por estar fazendo-os sofrer tanto. Posso afirmar que a parte mais difícil, é receber a notícia de que está morrendo, naquele primeiro momento, é como se sua vida fosse acabar no dia seguinte, mas não é bem assim, eu tenho tempo,

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mesmo que pouco, mas tenho. Percebi isso duas semanas depois do meu diagnóstico, quando eu queria apenas me afundar em lágrimas e pensamentos destrutivos, e assim se passaram duas semanas, não é como se eu estivesse aceitando, mas se só me resta oito meses, tenho que viver e é isso que farei. É domingo, e para minha surpresa, acordei mais cedo que meus pais, com isso, resolvi fazer o café da manhã; torrada com geléia de amendoim, ovo mexido, uma fruta e suco natural. Eu sempre odiei geleia de amendoim, mas por incrível que pareça, estava deliciosa. Meu pai chegou devagar, não sei por quanto tempo estava me observando, só sei que seu olhar era diferente, parecia triste, mesmo que em seus lábios estivesse um enorme sorriso. - Você é a melhor filha do mundo! - Ele me abraçou - Queria que soubesse disso! - Fiz nosso café da manhã! - digo ao retribuir o abraço, mas não fico mais que três segundos ao seu lado, saio querendo evitar um momento melancólico. Minha mãe se junta a nós, me enchendo de elogios, pelo café da manhã. Pela primeira vez após duas semanas, vejo minha mãe sorrindo de novo, foi aí que percebi que a felicidade deles depende de mim e de como me sinto. Deixo os dois sozinhos e subo para o quarto, vou direto em direção ao celular - quase 30 mensagens da Dani - Daniele é minha melhor amiga, nos conhecemos

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desde a infância e sempre fomos muito próximas. Ela provavelmente não está entendendo o motivo que me levou a ignorá-la todo esse tempo, e eu não direi mais que o necessário. A Dani é o tipo de amiga super protetora, se soubesse o que está acontecendo, seria capaz de me colocar em uma bolha. Então mando mensagem, como se nada tivesse acontecido. [Eu] — Hey, que tal sairmos hoje a noite? Estou com saudades! [Dani] — Você está brincando comigo, garota? O que aconteceu para me abandonar assim? Marcamos de nos encontrar na casa da Tânia, que resolveu comemorar o aniversário um pouco antes da data. Tânia se tornou minha amiga, por causa da Dani, confesso que antes de conhecê-la bem, tinha a impressão de que não passava de uma riquinha metida, mas a verdade é que ela é bem louca e de metida não tem nada. Aviso à minha mãe que vou sair à noite, apenas para não deixá-la preocupada, mas a expressão em seu rosto não é nada agradável. - Anny, querida… Você não devia sair com esses amigos, muitos deles são irresponsáveis. - Para, mãe, por favor! Dani virá me buscar, só vamos comemorar o aniversário da Tânia! - Você contou a Dani? - minha mãe perguntou, mas antes que eu pudesse responder, meu pai apareceu - Deixe ela ir, Iara, é bom que se divirta! - meu pai diz e se aproxima para me dar um beijo no rosto

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Não, George, não venha tirar minha autoridade de mãe, eu já estou sofrendo o suficiente… Quando percebi que ali se iniciava uma discussão, optei por deixá-los a sós, me sento na varanda, pois sei que Dani não irá demorar. O meu pai sempre fez todas as minhas vontades, o que não significa que eu tenha uma mãe ruim, ela apenas me protege (agora mais do que nunca). Em menos de 5 minutos, vejo Dani passar pelo portão da minha casa, mas não está sozinha, veio com o Renato, amigo da escola, que sempre foi apaixonado por ela e um outro rapaz, que eu não conheço, mas tem os olhos mais bonitos que eu já vi. - Amiga, que saudade! - ela sorri enquanto me abraça e me dá um soco no braço - Pensei que não fosse responder às minhas mensagens! - Eu sei, me desculpe, é que precisei me ausentar um pouco! - Desde que isso não volte a acontecer, você está perdoada! - ela realmente parece feliz - Olha só, deixa eu te apresentar… Esse é o Brian Gagliardi, ele vai a festa conosco! Brian me cumprimenta, sua mão está quente e levemente suada, seus olhos são tão expressivos, parece que já os vi em algum lugar. Nesse momento, percebo que não posso deixar de ir a essa festa. Eu entro rapidamente e me arrumo o mais rápido que consigo, não queria demorar, mas também não queria sair feia, então coloquei o meu melhor vestido e caprichei no penteado.

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Assim que desço as escadas, meu pai se aproxima com um sorriso. - Você está linda, filha! - ele me beija na testa - Vá e divirta-se! Eu o abraço e me encontro com os três, que me esperam na varanda. - Nossa, como você está bonita! Brian diz ao segurar minha mão, Dani concorda de imediato; O Renato não diz nada, sua atenção é voltada para a Daniele, o que eu acho fofo, ainda que ela não dê a mínima para ele. Quando nos aproximamos da casa da Tânia, vi que não seria apenas uma festinha, ela convidou vários meninos da escola, e como seus pais não estão, as drogas têm passe livre por aqui. Nós entramos, Tânia veio nos cumprimentar, me deu um beijo no rosto e logo me entregou um copo de cerveja, enquanto arrastou Dani para o meio e começaram a dançar. O Brian dá risada e tira o copo da minha mão; - Você não precisa beber se não quiser! - não sei como, mas ele percebeu o meu desconforto - É, eu sei… É estranho dizer, mas eu não me sinto tão à vontade aqui, o cheiro de fumaça está muito forte! - digo enquanto tento respirar - Então é melhor sairmos daqui, vamos tomar um pouco de ar. Venha comigo! - ele segurou minha mão e fomos para o lado de fora da casa Não sei porque, mas acho que já vi esse rosto antes, a voz dele é agradável e conhecida, mas não faço ideia de onde eu o conheço.

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Você está bem? - perguntou olhando para o celular - Sim, aqui fora está bem melhor! Ele coloca o celular no bolso e cruza os braços me olhando, com um meio sorriso. - O que foi? - perguntei - Você é muito bonita, estava te procurando no Instagram, suas fotos são incríveis. Eu nunca sei como reagir a um elogio, sinto que meu rosto está vermelho e a sobrancelha fora do lugar. - Ah, obrigada… - A gente vai ficar aqui parado a noite toda? perguntou insinuando que fossemos para outro lugar - Pode entrar se quiser… - Suponho que tenha vindo para se divertir, não é mesmo?! - ele coloca minha mão em seu ombro e sua mão vai até minha cintura - A música está alta o suficiente para conseguirmos dançar um pouco! Eu sorrio, mas me deixo ser levada por seus movimentos, ele colocou seu rosto junto ao meu, e mesmo sabendo que não estávamos dançando o ritmo da música, me permito viver o momento, afinal, não sabia o que estava acontecendo, Brian parecia querer me beijar e ao mesmo tempo, não, a única coisa que sei, é que eu estava gostando e muito. Porém, quando sinto que seus lábios estavam prestes a tocarem os meus, eu o afasto, foi tão rápido que nem ao menos me dei conta. - Brian, me desculpe…

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Mas o que houve? Pensei que você estivesse à vontade! - Eu tenho que ir agora, me desculpe! - Anny? Espera! Sem olhar para trás, começo a caminhar o mais rápido que posso. Por um instante esqueci completamente o que me aguarda, e isso não pode acontecer, eu não quero me sentir esperançosa, quando sei exatamente o que irá acontecer no futuro. Me permitir ser beijada por ele, seria como acender uma chama de vida a qual eu não tenho. Chego em casa, passo direto para o meu quarto, e lá estava minha mãe, sentada em minha cama com uma fotografia minha em suas mãos. - Mãe? - ela se assusta ao me ouvir - Eu já estou aqui! - Ah querida… me desculpe por hoje, não quero que pense que estou sendo egoísta! - Tudo bem, mãe, não se preocupe, nós ainda temos tempo… Ela me abraça e como no início da minha vida, pedi que ficasse ali comigo a noite toda. Quando acordo no dia seguinte, a primeira coisa que faço é olhar o celular, logo vi que havia duas mensagens do Brian no meu Direct e que ele curtiu todas as minhas fotos. - eu não vou abrir as mensagens Pensei 2 segundos antes de abri-las. [Brian] — O que aconteceu? Queria muito te ver de novo e poder pedir desculpas pessoalmente! Ele não me deve desculpas, fui eu quem agiu como uma maluca, saindo correndo daquela maneira.

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Eu o ignorei e em seguida apaguei a conversa, mesmo que ele seja extremamente legal, não quero voltar a vê-lo. Desço para tomar meu café da manhã, e ao passar pela sala de estar, vejo que meu pai conversava com alguém, para não atrapalhar, caminho um pouco mais devagar. - Oh... Filha? - meu pai diz ao perceber minha presença - Tem um amigo que veio te ver! Meu Deus, não pode ser o que estou pensando - Um amigo? - pergunto me aproximando e vendo o rosto do Brian Gagliardi - Oi, Brian… Tudo bem? - o cumprimento sem graça - Sim, tudo bem! Eu… - Vou deixá-los a sós! - disse meu pai, indo para o escritório - Anny, eu precisava falar com você, te mandei mensagem, mas não me respondeu, não sei o que aconteceu ontem a noite… Se fiz alguma coisa errada ou… - Não é nada disso, Brian, na verdade nem eu sei exatamente o que aconteceu, mas o problema não foi você, isso eu garanto! - Sério? Então você vai querer sair comigo novamente? - Na verdade não! - Claro que sim! - respondo após tentar dizer o contrário - Que tal amanhã? - Amanhã não vai dar, tenho um compromisso importante!

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Você está livre hoje a noite? - ele parece mesmo querer sair comigo, e é tão convincente, que não posso dizer que não - Estou, mas… - Então nos vemos mais tarde, agora eu tenho que ir, meu treino começa em alguns minutos! Ele se despede e vai embora, enquanto eu fico aqui, desapontada por não conseguir dar um fora nele. De repente, sinto uma forte dor de cabeça, que mesmo não durando muito, me deixou em alerta, meu pai apareceu quando percebeu que eu já estava sozinha. - Ele é seu amigo? Eu ainda não o conhecia! perguntou um pouco antes de perceber que havia algo errado - Você está bem? - ele se senta ao meu lado e sim, eu estou bem, mas a cada sinal, eu me dava conta da presença do câncer em mim. - Sim, papai, não se preocupe, eu estava apenas pensando. - Eu sou seu pai, te conheço desde que nasceu, sei quando você tenta esconder o medo… Não acha que ficaria mais fácil, se dividisse seus sentimentos com a sua mãe e eu? - Não tenho medo! - eu definitivamente estava com medo, mas ninguém precisa saber - Mas quero viver, pelo menos o máximo que eu puder, sem me arrepender de nada. Meu pai fica em silêncio por alguns segundos, parece tentar evitar as lágrimas — Você pode fazer o que quiser, querida, ninguém te impedirá de viver! - ele me abraça e volta para o escritório, eu tomei meu café, subi

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para o meu quarto e tento pensar em uma desculpa para não sair com o Brian hoje; - Você pode fazer o que quiser! Foram as palavras do meu pai e eu realmente quero ver o Brian outra vez. Eu não tenho tempo a perder, cada dia que passa, é um dia a menos. Pensando assim, viverei todos os dias como se fosse o último. Como de costume, ligo para Dani e conto que o Brian me chamou para sair. {Dani} — Ele é uma ótima pessoa, amiga, o conheço pouco, mas nunca ouvi falarem algo ruim a seu respeito! {Eu} — Na verdade, eu não me importo com a reputação dele, quero apenas me divertir. {Dani} — Que bicho te mordeu, Anny?! Você nunca foi assim! A Dani tem razão, nunca agi desta forma, mas não posso continuar me privando de nada. Enquanto eu falava com minha amiga, minha mãe abriu a porta e me mostrou algo que havia comprado para mim, desliguei o telefone e com um sorriso, tentei adivinhar o que estava dentro daquela pequena caixa. - É aquele colar que vimos alguns meses atrás, e que você adorou! - minha mãe fala, enquanto me vê hipnotizada com o colar em mãos - Vem, deixa eu colocar! - Mãe, eu não acredito… Muito obrigada! Ele é lindo! Eu a abraço forte e sinto a felicidade em seus olhos. - Ficou perfeito em você, meu amor!

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Paro por um minuto, tentando encontrar palavras para dizer a ela que hoje sairei novamente. - Mamãe, eu… - O seu pai já me falou que um amigo esteve aqui e te convidou para sair… Já faz muito tempo que você não precisa pedir permissão! - ela toca em meu rosto - Espero que aproveite bastante! Quando fico sozinha no quarto, vou para a frente do espelho e admiro o que acabei de ganhar. Meus pais sempre foram os melhores, mas confesso que ultimamente ninguém consegue superá-los. De repente, meu celular vibra, e vejo que é uma mensagem do Vicente - um amigo por quem já estive apaixonada - ele é de beleza mediana, bem mais velho que eu e é do tipo que pega todas, apesar de termos perdido o contato há um tempo, vê sua mensagem me fez lembrar do quanto eu gostava dele. Cliquei rápido na mensagem, e quando estou digitando uma resposta, chega mais uma notificação; É o Brian me avisando que estará aqui às 7 horas. Eu não penso muito e fecho a conversa com o Vicente, para respondê-lo. [Eu] — O que acha de irmos mais cedo? Estou precisando mesmo sair de casa! [Brian] —- Ótimo! Posso ir à sua casa em 30 minutos? Conheço um lugar legal! [Eu] — Claro, vou estar te esperando! Jogo o celular na cama e me arrumo para recebê-lo. Eu desço as escadas, vejo que minha mãe está na cozinha e meu pai deve estar no escritório, como sempre. No momento em que ele tocaria a campainha, eu abro a porta, fazendo-o tomar um pequeno susto.

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Ah… Oi. E aí, vamos? - ele perguntou sem querer entrar – Estou com o carro do meu pai! Por um instante, aguardo um elogio como o da última vez, mas ele não veio. - Vamos! - respondo passando pelo portão Ele entra no carro e eu vou logo em seguida. - Essa roupa fica muito bem em você! - Brian diz enquanto liga o carro - Obrigada! - eu definitivamente não sei reagir a um elogio, mesmo gostando de ouví-los - Para onde vamos? - Vou te levar para conhecer o lugar onde treino. Eu jogo futebol! - ele abre um sorriso tão bonito, que só percebo que estava olhando para sua boca, quando ele continua - Mas não se preocupe, o que aconteceu na festa, não voltará a acontecer. - É o que eu espero! - respondo pensando totalmente o contrário Enquanto ele dirige, eu me arrependo de tê-lo feito pensar que cometeu um erro na festa, quando na verdade, o único motivo que me fez pará-lo, foi pensar no tempo que eu não tenho, mas acontece que tenho tempo - não todo o tempo do mundo - mas o meu tempo. E se pararmos para pensar, cada pessoa tem um tempo determinado, ela apenas não sabe quando ele será interrompido, pois se soubesse, viveria todos os dias da forma mais intensa possível; Porém, eu sei e por isso, tempo é o que não tenho a perder. - Você não precisa ser tão radical, o que aconteceu ontem foi… Quer saber, você não

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precisa levar aquilo tão a sério! - digo após alguns segundos procurando as palavras - Bom, então suponho que fugiu para me fazer pensar em você - ele me olha nos olhos - E você conseguiu, senhorita Anny Thompson! - diz sorrindo – Naquela noite, eu não pude passar um segundo, sem que a imagem de você se afastando, passasse pela minha cabeça. Eu sorrio de volta, não o respondo, para que ele continue a falar. - Se ao invés disso, tivéssemos nos beijado, não teria causado o mesmo efeito. - E quem te garante isso? - pergunto dando risada Ele sorri e volta a olhar para frente até parar no que aparenta ser seu lugar favorito. - Chegamos! - Brian sai do carro e eu vou logo atrás dele - Aqui eu passo a maior parte do meu tempo livre, minha mãe diz que é perda de tempo, que se eu ajudasse meu pai no trabalho, ganharia muito mais - ele diz com o ar de decepção - Mas ainda acho que vou conseguir entrar em um time profissional! - Se é o seu sonho, deve segui-lo até conseguir e sem dúvida, conseguirá! - tento ser positiva - Obrigado, Anny, eu precisava ouvir isso! Brian me leva até a arquibancada, eu me sento e ele me aparece com uma bola de futebol em mãos. - O que é isso? Ele me olha, pois a resposta é meio óbvia; - Uma bola! - responde dando risada - Estou brincando… O que acha de jogar um pouco?

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Eu sou péssima jogando, não vai rolar! Qual é, Anny… Você parece uma ótima goleira, ou será que está com medo de perder? - É sério? Está me desafiando? - perguntei dando um tapa na bola que estava em suas mãos Ele sorri e eu paro de falar para admirar o sorriso dele. - E então… Vai aceitar o desafio? - Pode apostar que sim! Caminho até o campo e entro em posição - apesar de não saber nada sobre futebol Brian é alto e quando flexiona a perna, consigo ver os músculos se formarem - talvez tenha sido o motivo que me fez perder o primeiro chute dele - Eu me preparo para agarrar a bola em sua segunda jogada, mas ao tentar, sinto como se minha cabeça fosse explodir ali mesmo e não vejo mais o campo em minha frente, tudo que sinto, sãos as mãos de Brian quando já estavam em meu pescoço. - Anny? Você está bem? - ele se senta ao meu lado no chão e vira o meu rosto - O que aconteceu? - perguntei um pouco desnorteada - Poxa, Anny, me desculpe… Eu não devia ter insistido para que você jogasse. De verdade, me desculpe! - Para, Brian, relaxa! - eu tento me manter de pé e ele me olha como se tivesse - novamente - feito algo de errado - Pode ter certeza que não vou te culpar… a culpa é toda do… - eu respiro fundo antes de completar – Do sol!

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Olha, é melhor voltarmos para o carro, e eu ligo o ar… Será que você consegue me acompanhar? - ele pergunta demonstrando preocupação - Consigo, e você não precisa ficar assim, já falei que isso não aconteceu por culpa sua! - uso um tom grosseiro, mas a intenção era mostrar que estava tudo bem - Então de quem? Fui eu quem te convenceu a jogar! Eu começo a andar até o carro, sem respondê-lo e ele me segue. - Aposto que depois disso, não vai querer me ver por tão cedo, não é? - ele diz ao me ajudar a abrir a porta do carro Seu olhar de arrependimento - mesmo sem ter culpa me fez querer contar o real motivo de tudo, então para não falar, coloco minha mão em seu rosto trazendo-o para perto do meu. Nesse momento, sinto que ele estava um pouco receoso, até que meus lábios tocam os dele e finalmente nos beijamos. Quando seus lábios se afastam devagar e ele me olha nos olhos, prestes a continuar me beijando, eu coloco a mão em seu peito e o empurro lentamente. - É melhor a gente ir! - digo enquanto procuro o cinto de segurança, que parecia invisível naquele momento - Pode deixar, eu te ajudo! Ele se senta e antes de ligar o carro, me olhou mais uma vez.

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Lamento que nada tenha saído como eu imaginei! - Nada (nunca) é como a gente imagina, mas não quer dizer que isso seja ruim… as vezes é melhor do que o imaginado! - digo me referindo ao nosso beijo Ele sorri, coloca sua mão por cima da minha e eu sinto algo diferente - eu diria que diferente e muito bom - mas não é o que quero sentir, tenho medo que a essa altura do campeonato, eu me envolva emocionalmente - o medo deve estar refletido no meu rosto, pois o Brian está me olhando com a sobrancelha levemente franzida. - Por que me olha assim? - perguntei tirando a mão dele da minha - Não faz sentido dizer isso agora, mas tenho a impressão de que te vi em algum lugar. Ouvindo o que ele acabou de dizer, me lembrei que tive a mesma sensação quando o vi pela primeira vez. - Tenho certeza que nunca te vi antes! - digo olhando em seus olhos - Talvez… - ele diz e depois fica em silêncio o caminho todo Paramos em frente a minha casa, eu o agradeço e me despeço dele, porém, quando abro a porta do carro e estou prestes a sair, Brian segura o meu braço, para me impedir. - Se despede direito! - diz se aproximando para me beijar Eu viro o rosto e ele me olha, como se não entendesse.

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Brian, você é incrível, mas isso não voltará a acontecer… - Eu não entendo você! - ele coloca as duas mãos no volante e me olha - Primeiro demonstra querer e depois me dá um fora… Anny, se isso é parte do seu jogo de sedução, não vai mais funcionar… Sinto que ele tinha muito mais a falar, então o interrompi colocando a mão em seus lábios, em seguida me aproximei e o beijei. Um beijo longo, com gosto de quero mais e estava longe de ser um simples beijo de despedida, nesse momento eu percebi que não ia querer parar de vê-lo. - Você me deixa louco agindo assim e eu preciso que pare, pois já vi que se me apaixonar, vou sofrer muito! - diz segurando a minha mão - Mesmo que em parte tenha razão, eu quero continuar saindo com você, Brian. - É sério ou em alguns segundos, posso esperar o balde de água fria? - É sério… muito sério! - digo enquanto dou vários beijos em seus lábios Eu saio do carro e mesmo que ele ainda estivesse parado ali, entrei e me sentei no sofá; - Como foi com o seu amigo? - meu pai perguntou, vindo da cozinha - Foi ótimo! - respondo e fico em silêncio - Então qual o motivo dessa cara? - Nada, pai, nada… Eu vou subir e tomar um banho! - me levanto do sofá

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Espera… Dani vai jantar conosco, sua mãe a convidou. Eu apenas olho para trás, para que fique claro que escutei e continuo andando. Vou para o meu quarto, tranco a porta e me jogo na cama; – Amanhã tenho mais uma consulta! - Pensei e sem muito esforço, penso no Brian, que é tudo que eu não quero que aconteça, mas o que ele disse é verdade. Se apaixonar por mim nesse momento, é até crueldade. Me sento na janela do meu quarto e olhando os carros passarem, perco a noção do tempo, quando me dou conta, Dani já estava em minha casa e eu sequer havia trocado de roupa. Como sempre, ela vem até meu quarto e pula em cima da cama; - Ah garota, nem te conto o que aconteceu. - ela diz pronta para me contar – O Renato me pediu em namoro! Eu fico em silêncio, pois não sei exatamente se era algo bom ou ruim, levando em conta que ela nunca deu bola a ele. - Não fica muda… Eu aceitei! - ela diz sorrindo - Tá falando sério? Isso é incrível! - eu a abraço e me preparo para contar como foi com o Brian, quando minha mãe entra, para descermos, pois o jantar está pronto Dani me olha, sabendo que eu tinha algo para falar, mas sorri e me empurra para fora do quarto. - Depois me conta tudo! - sussurrou enquanto descíamos a escada

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Minha mãe é uma ótima cozinheira, e com a ajuda do meu pai, a comida não poderia estar melhor. Fico a maior parte do tempo em silêncio, não que eu não tenha algo a falar, apenas aprecio o momento e dou risada das piadas do meu pai, são as mesmas, mas não me canso de ouvi-las. Quando terminamos, Dani e eu voltamos para o meu quarto, ela parecia ansiosa para me ouvir falar sobre o Brian - ou a ansiedade era da minha parte?! - Como foi? Vocês se beijaram? Ele é muito bonito, não é? - pergunta animada - Nos beijamos e foi incrível! - digo enquanto me encosto no travesseiro – Aí amiga, ele é um fofo, mas… - Fala sério, Anny, você gostou dele, eu te conheço! - Gostei, claro que gostei, mas eu não quero me envolver emocionalmente. - E como vai evitar? Ele é bonito, simpático… - Para, Dani! - coloco a mão no rosto e sorrio – É estranho, mas ainda que eu quisesse, não vou poder ficar com ele - o sorriso se apaga dos meus lábios e eu mudo de assunto imediatamente – Olha só o que ganhei! - tento fazer com que ela não me pergunte sobre o que acabei de falar Dani me olhou confusa e quando ia começar a falar, seu celular tocou; Era o Renato que a convidava para sair. Ela pediu que ele a buscasse em minha casa e desligou.

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Você tem que ir! - disse enquanto guardava o celular - Não, de jeito nenhum! - sorrio – Eu não vou ficar segurando vela. - Não mesmo, por isso você vai convidar o Brian para ir conosco! - ela pega o meu celular e joga em minhas mãos - Não inventa, ele deve ter outros compromissos, e além disso, eu não tenho que ficar saindo apenas com ele. Olho para o celular, procuro um contato e mostro para Dani a pessoa que eu estava disposta a chamar. - É sério? Você só pode estar brincando… Prefere sair com o Vicente do que com o Brian?! - Mas ele é uma boa companhia! - digo enquanto digito a mensagem - Ah claro, Anny… Que ótima companhia, não é mesmo? Um homem que trata as mulheres como um objeto, realmente não existe companhia melhor… - Não fala assim, afinal, eu só não quero estar sozinha ao lado do casal, não é um compromisso! Mesmo odiando, ela concordou que o Vicente me acompanhasse e obviamente ele não recusaria o meu convite, pois deve imaginar que eu ainda sinto algo por ele, mas a verdade é que o Vicente pode me ajudar a parar de pensar no Brian. Ele é frio e um tremendo galinha. - Talvez seja o tipo ideal para o momento! -

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Me arrumo e aguardo o Vicente chegar, enquanto o Renato não se separa da Dani. - Acho que foi assim que ele conseguiu conquistá-la Depois de quase meia hora atrasado, Vicente apareceu vestindo sua camiseta regata branca, deixando à mostra sua nova tatuagem no braço. - Caramba, gata, pensei que já tinha me esquecido! - ele me abraça rápido para que pudesse cumprimentar a Dani e o Renato Era o Vicente de sempre, com seu jeito de malandro conquistador. O Renato escolheu um lugar tranquilo e agradável, afinal, ele é um romântico. Mas quem me surpreendeu foi o Vicente, ao contrário do que imaginei, ele adorou o lugar, porém, quando todos já estavam sentados, alguém chega atrás de mim; - Puxa vida, sinto muito ter demorado, Renato! Eu me assusto, pois pela voz sei que é o Brian, mas não fazia ideia de que o Renato o havia convidado. - Tudo bem, amigo, vou pedir que tragam mais uma cadeira! - respondeu o namorado da Dani Ele fez questão de cumprimentar cada um, e chegando a minha vez; sua mão segurou firme a minha e seu olhar era tão profundo que me fez sentir um vazio, uma culpa, e até mesmo vergonha. Vergonha por estar ali com o Vicente, como se fosse uma traição da minha parte, - mas nós nem somos namorados Ele está tão lindo, a camisa preta o deixa charmoso, principalmente com esse cordão de prata. Vez ou outra me pego olhando para ele, enquanto o Vicente se levanta e diz que volta já.

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Assim que ele desocupou a cadeira ao lado da minha, Brian se sentou. - Anny, Anny… Você sabe muito bem como destruir um coração! - ele sorri enquanto fala, mas seus olhos parecem estar olhando para a pior pessoa do mundo - Não é o que você pensa, ele… ele é apenas um amigo! - De qualquer forma, isso não faz diferença, não temos nada mesmo… Ele se levanta para ir embora e eu vou logo atrás, não quero que pense que fico saindo com todo mundo. - Brian, espera! - eu puxo sua camisa - Você não me deve explicações, Anny. É sério! - Eu sei, é que me importo com o que você vai pensar de mim. - Desde que te conheci, você tem ocupado boa parte dos meus pensamentos… Mas sempre que nos vemos, você me fere de alguma forma e logo em seguida me cura. As vezes é melhor ter você apenas em pensamento! - Você não conhece as minhas razões, Brian, não sabe o que me faz te querer e ao mesmo tempo te afastar… Eu penso em você, tá? Talvez até mais do que devo… - Eu sei que tivemos uma troca especial, mas você tem que parar de querer me afastar, de verdade, Anny, isso me confunde e me machuca. - ele parece tão sincero, que eu simplesmente o abraço

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Você tem razão, eu não vou mais te afastar, pode ter certeza disso! Eu beijo sua boca, enquanto ele se apoia no carro e me abraça. Ficamos assim por algum tempo, até que ele me leva embora; Eu o convido para entrar, mas ele não aceita, pois não quer ficar mal com os meus pais. - Se continuarmos saindo juntos, é melhor que seus pais tenham uma boa impressão minha. - É sério que isso importa? - perguntei - Claro, é importante que meus futuros sogros saibam que não sou um pervertido. Eu dou risada e o beijo mais uma vez, enquanto entro em casa. Quando acendo a luz para subir até o meu quarto, minha mãe apareceu furiosa; - Você já olhou que horas são? - perguntou apontando para o relógio - Será que não pensa no seu pai ou em mim, Anny? Não pensa na preocupação que nos causa? - Eu não queria chegar tão tarde, é que o Brian estava lá e a gente ficou conversando… - Você não havia ido com o Vicente? - Sim, mas ele me deixou sozinha e o Brian me fez companhia. Minha mãe não conhece o Brian, mas também nunca foi do tipo que vai contra as minhas relações. Mesmo tentando manter a pose de durona, ela sorri quando eu falo o quanto ele é bonito e que havia dito que gosta de mim.

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Ah querida, se ele realmente for tudo isso que está falando, não posso deixar de me alegrar por você. - Obrigada, mãe! Agora é melhor irmos, pois o dia já está amanhecendo. - eu sorrio e lhe dou um beijo no rosto Deito em minha cama após o banho, eu estava tão cansada que dormi em menos de 5 minutos. Às 8 da manhã, meu pai bateu na porta do meu quarto, e foi entrando, antes que eu pudesse responder. - Vamos, filha, acorda! - diz tirando o cobertor que eu havia acabado de colocar sobre o rosto - Eu já acordei, papai, só me dá mais um minuto… ou melhor, cinco, só me dá mais cinco minutos! - volto a fechar os olhos, quando ele abre a janela e eu não tive outra opção, a não ser me colocar de pé. - Não pode perder a consulta. Rápido, sua mãe está esperando! - diz saindo do quarto Eu me arrumo, com a sensação de ter tido, nada mais que três horas de sono. Chegando ao hospital, e realizando novos exames, vimos que o tumor estava começando a se espalhar, o que já estávamos esperando, já que ele não pode ser removido, a surpresa é que está acontecendo de forma mais lenta. Com isso, eu senti um certo alívio, talvez até um pouco de esperança, - E se estiverem errados esse tempo todo, e eu tiver a vida toda pela frente?! Afinal, os médicos também podem se enganar, não é mesmo?!

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Minha mãe que sempre me acompanha, também suspirou aliviada, mesmo que no fundo ela torcesse para que o tumor tivesse desaparecido completamente. - Isso é bom, não é doutor? - perguntou sem soltar minha mão - Na verdade, é ótimo! - respondeu olhando para mim - Você é um símbolo de força, Anny. O sorriso no rosto do doutor, me deu ainda mais esperança. Nós voltamos para casa, levando a boa notícia; Senti vontade de ligar para a Dani, e falar que por incrível que pareça, acabei de ver uma luz no fim do túnel. Queria poder compartilhar isso com alguém, mas não posso, a única forma é ligar para o Brian e dizer que precisamos sair, que estou feliz e tenho que vê-lo. E foi exatamente o que fiz, deixei uma mensagem em sua caixa postal. Eu estava feliz, não é uma felicidade completa, mas é algo que não podia guardar só para mim. Já é noite e o Brian ainda não me respondeu; Hoje não passei o dia no quarto, cuidei do jardim, ajudei meu pai a organizar o escritório e minha mãe teve a minha companhia para fazer o jantar. - posso estar exagerando, mas após voltar do hospital, senti que tenho tempo para realizar tudo que um dia planejei Quando terminei de jantar, voltei a olhar o celular e ele ainda não havia respondido, confesso que fiquei chateada, mas não enviei uma nova mensagem, ainda que quisesse muito. Ainda na sala, olhava seu perfil a cada intervalo da minha série de tv favorita, estava irritada com ele, mas ao mesmo tempo, penso que o Brian não agiria assim,

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ou talvez eu esteja enganada, afinal, não o conheço o suficiente. Deixo meus pais e vou para o meu quarto; o celular vibra, imagino que seja ele, mas finjo não ter dado importância ao seu "sumiço", por isso coloco meu celular na mesa de apoio e vou dormir. Na manhã seguinte, a primeira coisa que faço é ver quem realmente me mandou mensagem ontem. [Brian] — Minha bela Anny, sinto muito só agora ter recebido sua mensagem. Se prepare porque nos veremos amanhã, para termos o dia mais divertido de todos! Li sua mensagem várias vezes, até perceber que eu já não estava mais chateada, e que queria mesmo esse dia tão divertido do qual ele falou. Minha mãe entra no quarto, para me avisar que estão me esperando lá embaixo; só poderia ser o Brian. Desço animada, até chegar e ver o Vicente sentado no sofá. - Oi… Eu não poderia deixar de vir aqui, já que você não respondeu minhas mensagens. - ele diz ficando de pé - Eu te devo desculpas… não devia ter saído daquele jeito! - Não vim falar do que passou, Anny… Eu quero que você saia comigo, e que dessa vez seja só nós dois. - Tenho um compromisso hoje, mas talvez em um outro momento sairemos. - tento ser simpática, mesmo querendo que ele fosse embora

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Ele volta a se sentar e pela janela vejo o Brian passando. Meu coração bate mais forte, pois tudo que eu menos queria, era que ele visse o Vicente ao meu lado outra vez. Eu abro a porta e o convido a entrar; ele me beija sem se dar conta de que havia mais alguém ali. O Vicente, que viu tudo, se aproximou para cumprimentá-lo e se despedir de mim. - Você estava com ele? - perguntou Brian - Não, ele veio me chamar para sair… - Ele gosta de você, não é? - pergunta com um sorriso sarcástico, enquanto me abraça - Na verdade, eu é quem gostava dele, mas já faz muito tempo, e confesso que não foi nada legal. Porém, acredito que não veio aqui para falar sobre o Vicente… - Claro que não, estou aqui para darmos início ao nosso dia! - ele me puxa para fora, mas eu paro imediatamente - Não, Brian… Nem sequer me arrumei. Ele dá risada - É sério? Você é tão linda, que até não se arrumando, é como se estivesse arrumada! - Que mentiroso! - eu sorrio Nossos sorrisos param, quando ele vê minha mãe se aproximando. - Bom dia, senhora! - diz um pouco tímido - Eu sou o Brian… Brian Gagliardi! - Olá, Brian, é muito bom dar um rosto a esse nome. - minha mãe toca seu ombro - Vão sair agora?

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Se não tiver problema, eu gostaria de levar a Anny a alguns lugares… Ontem prometi que teríamos um dia divertido e é o que quero proporcionar a ela! - ele esbanja simpatia - Que incrível, eu espero realmente que vocês se divirtam. Ela vai para a cozinha e ele me olha com um sorriso; - Uau… Que mãe linda você tem! - É… E você foi muito bem, garanto que já tem 5% da aprovação dela! - brinco - 5%? Nossa, eu realmente sou incrível! - ele diz sorrindo – Agora acho que podemos ir, não é? Hoje ele estava no carro da mãe, dirigiu cerca de 20 km da cidade, até chegar em um lugar estranho, parecia uma casa abandonada ou uma fazenda, não sei ainda. Ele começa a parar o carro. - Você vai parar aqui? - perguntei assustada - A gente precisa comer alguma coisa, antes de continuar! - ele desce e me espera Ainda não sei o motivo de fazermos isso fora do carro, mas continuo seguindo seus passos. - Não poderíamos comer no carro? - perguntei - Poderíamos sim, mas o que teria de divertido nisso? - diz levantando parte da cerca de arame para que eu passasse - Você é louco! - sorrio Ele se abaixou em minha frente, insistindo que me levaria em suas costas. Eu não iria perder a oportunidade, afinal, foi ele quem quis me meter nessa.

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Se você me derrubar, os 5% de aprovação serão zerados! - brinquei, enquanto ele andava como se eu nem estivesse em suas costas Avistei uma árvore enorme logo em nossa frente, o chão estava limpo, e os bancos de madeira, me fizeram imaginar que houvesse alguém em algum lugar próximo. - Você conhece esse lugar? - perguntei enquanto ele me colocava no chão - Conhecer, eu não conheço, mas já estive aqui antes, e é um bom lugar para fazermos nossa refeição. Brian tirou da mochila que carregava em suas mãos, um recipiente e colocou em cima do banco. - Esse é o seu! - apontou - Aqui tem torrada com creme de amendoim e suco, que eu mesmo fiz, mas é para comer depois desse aqui - ele coloca outro recipiente, esse é um pouco maior que o anterior - Eu coloquei frango grelhado, farofa e uma salada bem leve… Espero que goste! Ele apresenta tão orgulhoso seus pratos, que não posso deixar de provar. - Meu Deus, está maravilhoso! - digo com a boca quase cheia Após terminarmos de comer, eu chego mais perto e coloco a cabeça em seu ombro. - É sério que já esteve aqui? - perguntei - É sério sim, ontem mesmo… - Ontem? - Eu queria te levar a um lugar onde você nunca tivesse ido, mas para não correr risco de errar,

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decidi procurar o mais distante possível e cá estamos. Seu rosto fica levemente corado, enquanto eu aproximo meus lábios dos seus. - Eu ficaria aqui te beijando o dia inteiro, mas temos que voltar para o carro… Ainda não chegamos ao nosso destino final! - diz Brian - Para onde está me levando exatamente? - Ainda não sei, ontem eu só vim até aqui, mas o Google me mostrou um lugar incrível e fica bem próximo de onde estamos. Por incrível que pareça, confio nele, seus olhos me trazem uma confiança inexplicável. - Então vamos! - digo colocando tudo de volta na mochila Ele segura minha mão, até chegarmos ao carro. Mais 30 minutos de estrada e finalmente chegamos. O lugar está tomado pelo mato, não há sequer um caminho visível, mas nada o impediu. Ele voltou a me carregar até chegar no ponto exato. Vi um lago razoavelmente grande, a água é tão clara que podemos ver o fundo, e se não fosse todo esse mato ao redor, seria o lugar mais bonito que eu já vi. - Está um pouco diferente do que eu vi na foto, mas não deixa de ser lindo! - ele diz e tira a camisa - Na verdade, fica mais bonito assim, como o Criador o fez! Eu não deixo de concordar, se olharmos apenas para o lago, e ignorarmos tudo ao seu redor, podemos ver o quão bonito ele é.

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Você vai mesmo entrar? A água deve estar gelada! - eu chego mais perto, enquanto Brian pula na água - Está quentinha… Vem, Anny, você não pode me deixar sozinho nessa! - disse me molhando - Eu não sei nadar muito bem, tenho medo! - Você pode não nadar bem, mas eu sim… Vamos, confie em mim! - ele sai e estende a mão - Confia, vai, por favor… Com ele pedindo assim, é claro que confio. - Não esquece, você já tem 5%... Ele dá risada - Não vou esquecer, até porque estou em busca dos 100%. Entrei na água logo após ele e abracei seu pescoço, quando vi que já estávamos na parte funda. - Que água deliciosa! - falei - Viu só? Eu avisei! Ele me olha nos olhos com um pequeno sorriso e eu não posso evitar a vontade de beijá-lo. - Acho que estou apaixonado por você, Anny Thompson! - ele não sorri ao falar isso - E isso é ruim? - perguntei - Se você não sentir o mesmo, não é só ruim, é terrível! - ele encosta o rosto no meu É claro que sinto o mesmo, mas não quero que ele saiba, não quero que pense que me conquistou assim tão facilmente. - Gosto de estar com você, Brian, então já não é tão terrível assim…

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Bom, isso é verdade! - ele me beija no rosto, me levando para a parte onde consigo colocar os pés no chão – Fica aqui! Ele mergulha sem me dar chance de dizer uma palavra. - Esse garoto é pirado! - pensei Não demorando muito, Brian aparece, mas é apenas para tomar um pouco de ar e volta a mergulhar. Quase 2 minutos depois, ele vem até mim, completamente sem fôlego. - Ah garoto… Você quer me matar do coração? Ele sorriu respirando fundo e mostrando uma pedra; - Tudo isso por uma pedra? - perguntei tirando-a de suas mãos e quando estou prestes a jogá-la de volta, ele grita - Não joga! - ele a pega de volta – Um dia vou te pedir em namoro e essa será nossa aliança! - Nossa aliança vai ser uma pedra? - eu dou risada Tudo bem que se tratava de uma pedra muito bonita, talvez a mais bonita que eu já vi, mas ainda era uma pedra… Não consigo me ver sendo pedida em namoro com uma pedra. - Não é para rir, eu falo sério. - Tudo bem, desculpe… Mas é sério que acha que vou aceitar seu pedido? - me faço de difícil - Você vai, ah, claro que vai! - ele me beijou em meio a sorrisos Quando estou com o Brian, não há um só momento em que não estamos sorrindo, ele é divertido e me faz bem. Saímos da água, ele colocou sua camisa no chão, para que eu me sentasse e se sentou ao meu lado.

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Está cansada? - perguntou encostando os lábios em minha testa - Você quer ir agora? - Essa paz não me faz querer ir embora! - E se a gente ficar? - ele sorri como um menino levado – Podemos passar a noite no carro, ainda temos muita comida! - Brian, não invente, vai… Isso seria uma loucura. - Uma loucura boa, eu diria. Ou por acaso tem medo? - perguntou apertando minha bochecha - Medo? Claro que não, acontece que… É talvez eu tenha medo! Ele sorri – Tudo bem, minha bela Anny, em algumas horas te levarei para casa, mas antes você vai se deitar em meu peito - ele se deita no chão e coloca minha cabeça no lado esquerdo do seu peito – apenas para que eu possa te sentir mais perto! Sinto seu coração batendo forte, levantei um pouco o olhar e vi que ele estava com os olhos fechados. - Brian? - espero ele me olhar - Você é sempre tão intenso assim? - Normalmente não, mas é você quem me faz agir assim. - Por que? - perguntei - Só você pode responder, pois eu também não entendo. Tem sido tudo novo para mim, e isso me dá até um pouco de medo! - disse Brian - Do que sente medo? - De me envolver e você desaparecer do nada, ou me pedir que te deixe em paz. Eu me sento – No início talvez eu fizesse isso, mas agora não… Estar com você tem sido especial, Brian.

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Ele me beija, passando a mão em meu rosto, em seguida suas mãos adentraram meus cabelos e seus lábios desceram até o meu pescoço. - Prometo que só vou continuar, se você quiser tanto quanto eu. - sussurrou próximo ao meu ouvido - Eu… Eu não quero! - falei baixinho - Tudo bem, meu amor! - ele me abraça e beija minha cabeça É a primeira vez que ele me chama assim, e eu espero que não seja a última; Ele é intenso e eu adoro essa intensidade, que me faz querer ser igual. Eu me levanto e caminho até conseguir molhar os pés no lago; não sei se me levantei rápido demais ou se é o universo me fazendo voltar a realidade, mas quando viro o rosto para olhar para Brian, sem ao menos perceber, já estava de joelhos e ele logo atrás de mim, com as mãos em minhas costas, enquanto meus olhos tentam encaixar a paisagem como um quebra cabeça. - Você está bem? - ele pergunta preocupado Sem dúvida a resposta seria não, mas não pelo que acabou de acontecer e sim por atrapalhar um dia que tinha tudo para ser perfeito. - Por favor, Anny, me responda! - ele vira meu rosto em sua direção - Você está bem? - sua voz soa baixo - Sim! - tento tirar suas mãos de mim - Não foi nada, está bem?! Me solta! - empurro sua mão Olho para o seu rosto e vendo seus olhos sem brilho, me senti mal por tratá-lo dessa maneira. Coloquei

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minha mão em seu rosto e deslizei o polegar em sua bochecha. - Me desculpe, tá bom? - me apoio nele até ficar de pé - Não quero que me solte, Brian! - eu o abraço forte, ele me aperta em seus braços, mas não diz uma palavra Talvez ele pense que agindo assim, eu esteja querendo culpá-lo de alguma forma, mas a realidade é outra. Eu estou me culpando e tendo a certeza de que sou a última pessoa que devia estar ali com ele. - Vamos, Anny, eu vou te levar para casa! - ele segura minha mão, mas eu o paro - Não! - o puxei devagar – Só vamos sair daqui, quando o sol se pôr. - eu sorrio para que ele esqueça o que aconteceu - Então você está se sentindo bem? - pergunta ainda preocupado - Claro, eu te disse que não foi nada… Esquece isso, tá legal?! - digo segurando seu rosto com as duas mãos, antes de beijar sua boca - Ah, depois desse beijo, eu já esqueci! - ele sorri enquanto volta a me beijar Ele afasta a boca da minha, mas continua me abraçando, está tão calado que fica difícil decifrar sua expressão. - Brian? - o chamo olhando em seus olhos, que estavam perdidos no horizonte - O que? - ele volta o olhar para mim - Tivemos um dia divertido! - falo baixo Ele sorri e seus olhos brilham - É… Tivemos! - disse pressionando os lábios em minha testa

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Assim que o sol se põe, voltamos para o carro e Brian me diz que ficaremos três dias sem nos ver. Claro que não entendi o motivo, mas também não o questionei, para não parecer tóxica. - Nossa, vai mesmo sentir minha falta, né?! - ele debocha por eu não ter dito nada e sorri - Ah, para! - bato em seu ombro - Claro que vou sentir sua falta, mas só um pouquinho! - digo sorrindo Ele liga o som do carro, e vai passando as músicas, até chegar na sua preferida. Eu nunca tinha ouvido aquela música, mas ele a repetiu tantas vezes e cantava tão empolgado, que acabou se tornando a minha preferida também, não pela música, mas por toda a sua alegria ao cantá-la. Quando chego em minha casa, vejo a melhor cena que uma filha poderia esperar: meus pais sentados juntinhos, conversando e sorrindo, como se acabassem de se conhecer. Eu chego e me jogo entre os dois. - Que fofos, meu Deus! - digo com voz de bebê Eles dão risada e me abraçam juntos. Eu fico de pé. - Você está com a roupa molhada. - minha mãe observa – Faz parte do dia divertido? - Sim, mamãe, e você não imagina como o lugar é bonito, o lago é perfeito e tão natural, que traz uma paz só de olhar! - eu descrevo animada os detalhes e subo para o quarto Tomo banho, coloco o pijama e me jogo na cama. Estou exausta. O que era para ter sido três dias, acabou sendo três semanas sem o Brian e eu nos vermos pessoalmente.

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Três dias por seus motivos e três semanas em que fiquei internada. Sim, eu tive a primeira sensação real de morte, mas ainda assim, não deixei de falar com o Brian, mesmo que fosse só alguns minutos de ligação. A Dani não saiu do meu lado um só minuto, ela acabou sabendo de tudo e vendo o estado em que ficou, partiu meu coração em mil pedaços. Sei que ainda tenho tempo, mas essas semanas vieram para destruir minhas expectativas, nunca estive tão mal em toda minha vida. Contudo, os exames continuam iguais, não houve uma alteração significativa, o que aconteceu foi que a minha imunidade baixou muito. Agora fazem 24 horas que eu saí do hospital, vou poder finalmente encontrar o Brian; Estou em meu quarto, quando minha mãe entra e diz que ele já estava aqui, antes que eu me levantasse da cama, ela abre um pouco mais a porta e o vejo logo atrás dela. - Poxa, mãe… - digo passando a mão em meus cabelos, na tentativa de arrumar – Estou horrível! Ele entra com um sorriso no rosto, enquanto minha mãe fecha a porta. - Acho que já tenho uns 10%. - brincou com o fato de estar em meu quarto – Para, Anny, você está linda! - diz tirando minha mão dos cabelos - Devia ter me avisado que viria pela manhã! - Eu não pude esperar mais, precisava te ver, e tenho uma surpresa para você! - ele tira uma caixinha do bolso e me entrega

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Eu sorrio com a pequena caixa em minhas mãos, enquanto ele parecia ansioso para me ver abri-la; - A surpresa está dentro da caixa… Só pode ver se abrir, não é mesmo?! - ele passa uma mão na outra e sorri, para tentar disfarçar o nervosismo Quando abro, vejo que é um anel, mas quando percebi que não se tratava de um simples anel, o sorriso não saiu dos meus lábios. - É a pedra! - A pedra no anel de prata que ele acabara de me dar, é exatamente a que ele encontrou no lago. Eu pulei em cima do Brian e o beijei tanto, que por um instante pensei que ficaria sem ar. - É maravilhoso, Brian! - eu o abraço ainda mais, ele sorri e se afasta um pouco - Bom, agora falta você aceitar… - ele aperta os lábios, esperando minha resposta - Você ainda não fez o pedido! - falei entregando o anel a ele - Quer namorar comigo? - perguntou confiante Antes de responder, finjo pensar um pouco – Claro que quero! - Ele me beijou e se sentou em minha cama, me puxando para o seu lado - Por um instante pensei que você estava me afastando, quando não quis me ver. - ele diz se referindo às três semanas passadas - Mas eu te ligava quase todos os dias! - falei passando a mão em seus cabelos Ainda que quisesse saber o que me levou a mantê-lo longe, não me fez pergunta alguma; Ele foi até a janela e se sentou

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Suponho que seja esse seu cantinho favorito, não é? - perguntou me vendo chegar mais perto - Como você sabe? - me sentei em seu colo e ele abraçou minha cintura - A vista é tão linda, que parece te conectar com o Criador! - respondeu ele - O Criador? - perguntei – Por que sempre menciona ele? - Porque eu acredito na sua existência, acredito e deposito toda a minha fé nele! - seus olhos brilharam ao mencionar sua fé - Então acredita que exista um céu, para quando morrermos? - perguntei - Na verdade, eu não só acredito, como tenho certeza! - ele se levanta e me beija – Mas agora eu tenho que ir, vou treinar e depois terminar um trabalho, nos vemos à noite? - ele pergunta enquanto me puxa pela cintura - Não sei, mas eu te aviso, tá bom? - encosto meus lábios nos seus Ele me faz tão bem, que me sinto péssima quando imagino que em algum momento, tudo isso vai acabar; Mas as vezes só de olhar para ele, sinto tanta vontade de viver, vontade de tê-lo por perto todos os dias e nunca o fazer sofrer. Quando saiu do meu quarto, eu só sabia olhar para o anel em meu dedo; É tão lindo e significa tanto, que jamais vou tirá-lo. Passei o restante do dia no escritório do meu pai, quero começar a trabalhar e ocupar o meu tempo, mas para isso, tenho que pesquisar muito, ainda bem que hoje

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tive a ajuda da minha mãe, mas ainda assim não consegui encontrar nada que me agrade. Quando estou trancando a porta do escritório, meu celular toca; {Dani} — Como está se sentindo? Ainda não pude ir a sua casa, mas a noite vamos sair, ok? {Eu} — Estou ótima, como quem tem uma vida inteira pela frente! - eu dou risada {Dani} — Não brinca assim, garota… Olha só, você não disse nada sobre o que acabei de falar. {Eu} — Sobre sairmos? Não tenho certeza, o Brian quer me ver a noite, e… nós estamos namorando! {Dani} — Jura? E você já contou a ele? - ela se refere ao meu estado de saúde {Eu} — Você quer mesmo me desanimar agora? Não deixei ela responder e desliguei, afinal, o que importa se ele sabe ou não?! Eu tenho total consciência de que isso não mudaria nada na minha vida, apenas na vida dele, e a essa altura, a última coisa que quero é estragar o que estamos vivendo; Tenho que aproveitar cada segundo da minha vida, tendo pelo menos um alguém que sonhe em me ter aqui no futuro e que eu saiba que é de verdade, ainda que esse futuro nunca venha. Quero continuar com a sensação gostosa de ser olhada com os olhos de amor e não de pena… Esses olhares são mais cruéis que o tumor que me mata aos poucos e eu não aguentaria se o Brian me olhasse assim; A noite, quando o Brian me ligou e não o atendi, ele apareceu aqui, eu estava ajudando com o jantar quando ele chegou.

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Desculpe, meu amor, é que além de ser impaciente, também estava com saudades! - ele disse me dando um beijo - Não peça desculpas, eu adoro quando você vem me ver. Ele cruza os braços em cima do balcão e me olha meio bobo — Que linda você cozinhando… Sabe, eu posso te ajudar se quiser, sei fazer um molho que fica incrível com essa carne que você preparou! - ele não perde tempo e coloca o avental que acabou de tirar de mim - É sério que vai me ajudar? - eu sorrio - Sim, muito sério! - respondeu abrindo a geladeira — Onde está o tomate? Minha mãe veio até a cozinha, quando ele já estava colocando os ingredientes na panela; - Brian? - ela sorri colocando as duas mãos em seu ombro — O que está fazendo? - Oi, senhora Thompson, hoje o toque especial do jantar, ficará por minha conta! - ele tira a panela de cima do fogão por 2 segundos, e em seguida beija os dedos, fazendo minha mãe e eu darmos risada - É ótimo que você tenha toda essa disposição, Brian, ótimo mesmo! - minha mãe diz um pouco antes de se retirar Ele me olhou e sussurrou — 30%! - eu sorrio me aproximando para beijá-lo - Quando se trata de conquistar a sogra, você manda muito bem! - falei em voz baixa - Eu te disse… Meu objetivo é que seus pais possam ter a certeza, de que eu não quero só

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um passatempo! - ele me beija e volta a cuidar do molho Ele está tão concentrado, que eu apenas o observo; O Brian tem tirado todo o meu foco desde que descobri o câncer, pois na verdade, a única vontade que eu tinha, era viver da forma como nunca imaginei antes e fazer tudo que eu jamais faria, porém, tenho um namorado que é exatamente como imaginei minha vida inteira, ele me faz ter esperança, faz com que me sinta viva, quando eu apenas preciso viver… Não viver por uma outra pessoa, mas por mim mesmo. Amo e odeio tê-lo por perto, por me fazer esquecer de tudo, tudo que eu quero lembrar e ao mesmo tempo… esquecer! - Caramba, a gente faz uma dupla e tanto, não é mesmo? - ele diz ao terminar o molho - Ah, sem dúvida! - respondo ao voltar de meus pensamentos Ele sorri e joga o avental no balcão — No que você tanto pensa, minha Anny? - Estava pensando em como somos bons na cozinha! - passo a mão em seu rosto e não deixo de olhar nos olhos mais bonitos que eu já vi - A verdade é que somos bons juntos! - ele me beija e em seguida pega minha mão para ver se eu usava o anel — Uau, que anel lindo! - diz dando risada e beijando minha mão Brian me ajudou a servir o jantar, e obviamente seu molho recebeu elogios. Meu pai me olhava orgulhoso, me ver contente era o suficiente para que ele adorasse o Brian e o fato dos

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dois torcerem para o mesmo time, também ajudou um pouco. Quando terminamos, o Brian foi quem ajudou minha mãe com a louça; eu diria que agora ele tem 50%, mas é tão espontâneo que tenho certeza que não é pelos pontos, ele realmente é educado e prestativo. - Eu conquistei sua mãe com muito menos! - diz meu pai quando ele sai da sala de jantar Eu dou risada — Acho que ele não faz com essa intenção, pai! - Claro que faz, querida, mas de qualquer forma, é um bom rapaz, conheço a família dele! - diz me deixando sozinha Não sei o que quer dizer com conheço a família dele, mas o fato de não ter mencionado isso antes, me faz imaginar que andou pesquisando sobre o Brian e a família, o que se tratando do meu pai, não me surpreende nenhum pouco. Enquanto estou colocando as cadeiras em seus devidos lugares, minha mãe grita na cozinha; - ANNY, VENHA AQUI, RÁPIDO! - sua voz soa aflita Eu largo a cadeira imediatamente e corro até a cozinha. Vejo minha mãe segurando o braço do Brian, que estava com a mão esquerda presa no ralo da pia, no momento não sei o que fazer, ela me pede um pano e eu rodo a cozinha inteira até encontrar, é nessa hora que me dou conta de que sim, nossa pia tem um triturador e que a mão dele estava presa ali, ele já estava vermelho de dor, mas não dava um grito sequer. - PAI, CORRE, POR FAVOR! - gritei logo que percebi

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Meu pai veio o mais rápido possível, pela sua expressão, pensou que o problema fosse comigo. - Não está doendo tanto, na verdade, não estou sentindo dor nenhuma! - disse Brian - Você sente a mão? - meu pai perguntou - Não! - respondeu assustado — Isso significa o que? Ninguém responde, mas meu pai começa a desmontar a pia e o triturador, vendo que na verdade, eram os dedos que estavam presos, quando já estava com a mão livre, o Brian não fazia questão de esconder o quanto estava doendo. - Que dor terrível! - disse se sentando ao chão, segurando a mão com força Eu vou para o lado dele, ainda sem saber o que fazer, e peço que ele se levante; - Você precisa ir ao hospital, temos que saber se quebrou! - falei ajudando-o a ficar de pé - Não, eu odeio médicos! - disse mexendo os dedos — Viu só?! Não está quebrado! - ele sorri disfarçando a dor Minha mãe não se importa com o que ele diz, ela apenas afirmou que iria levá-lo ao hospital e ele não se opôs. Eu só consigo pensar no que ele dirá aos pais quando chegar em casa machucado. - Sua mãe ainda nem me conhece, e… - Ah, para com isso, não é a primeira vez que me machuco. - ele me interrompe. — Agora você deve segurar minha outra mão, antes que eu fuja! - É sério? Os médicos te assustam tanto assim?

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Sim, é bem sério, e em outro momento te falo o motivo! - ele segura minha mão, querendo esquecer que estávamos a caminho do hospital No hospital correu tudo bem, nada grave aconteceu com seus dedos, então tirando o fato do Brian quase entrar em pânico antes de ser atendido, estava tudo perfeitamente bem. Minha mãe se dispôs a acompanhá-lo até em casa, mas a real é que eu queria que ele ficasse; - Chegando em casa a essa hora, com a mão enfaixada, só vai fazer com que seus pais se preocupem… Eles não precisam ter essa preocupação agora! - tento achar um motivo para fazê-lo ficar - Não, meu amor, eles não vão me ver chegar, eu tenho minha própria chave, meus pais não são do tipo que me esperam a noite! - ele me beija no rosto — Na verdade, eu já devia estar morando sozinho! Ele se despede e vai embora, enquanto minha mãe me encara - É impressão minha ou você quase o convidou para dormir aqui? - perguntou ela - É impressão! - respondo sorrindo e dando um beijo em seu rosto, antes de subir para o meu quarto Meu pai veio até meu quarto, quando me viu entrar. - Ele está bem? - perguntou ao passar pela porta - Está sim, não foi nada grave!

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Ah, querida, você está gostando mesmo desse rapaz, não é? - perguntou se sentando em minha cama - Sabe, papai, sinto que o Brian gosta de mim mais do que deveria… - Mas é isso que você merece, alguém que goste de você! - diz tirando meu cabelo do rosto — Eu não poderia estar mais feliz! Ele sem dúvida andou pesquisando, meu pai não costuma fazer elogios a um rapaz, caso não saiba mais sobre ele e a família. - Preciso perguntar uma coisa… Como conhece a família do Brian Gagliardi? - perguntei - Bom, eu… Eu andei… Quer saber, tenho meus contatos e isso basta! Ele vem de boa família, nunca se envolveu em coisas erradas, o pai é rígido e exigente, ou seja, o genro ideal! - diz ficando de pé - Sei que suas intenções são boas, papai, e que tudo que quer é me proteger, mas que fique claro que meu relacionamento com o Brian, não vai durar muito, o motivo nós já conhecemos e o único que sairá machucado dessa relação, será ele! - Durma bem, filha! - ele me deu um beijo na testa e saiu sem comentar nada sobre o que acabei de falar Mas conheço todos os seus gestos, sei que ele e minha mãe sempre vão preferir se enganar, mas eu não, sei exatamente que um futuro ao lado do Brian, é impossível. - É uma pena que quando estou ao seu

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lado, não consigo pensar assim. - Seus olhos me cativam, me faz imaginar que o impossível é possível. A vida é muito injusta pois eu poderia tê-lo encontrado antes, teríamos tido tempo - eu teria tempo - não precisaria sentir todo esse medo e essa angústia que assola meu coração; mesmo acreditando que nada é por acaso, queria que pelo menos dessa vez tivesse sido diferente. Acabei dormindo com esse pensamento e tive um sonho, tão real que demorei para saber qual era a minha realidade; - Me levantei assustada com minha mãe batendo na porta do quarto, ela parecia tão feliz, que me fez abrir um sorriso, sem ao menos saber o que aconteceu. — O seu médico ligou! - disse ela me abraçando — Querida, você não tem câncer! Eu fiquei paralisada, definitivamente não entendi o que ela acabou de me dizer. — O que está dizendo, mamãe? - perguntei antes de abraçá-la mais forte — É isso mesmo, meu amor, seus exames foram trocados, nunca existiu tumor, nunca houve doença! - a minha mente buscou o Brian e eu não consegui deixar de pensar nele, em tudo que vou poder viver ao seu lado e no quanto estava errada, ao falar que nosso relacionamento não vai durar. Eu abracei tanto a minha mãe e o meu pai que apareceu logo em seguida, que ainda pude senti-los em meus braços, quando abri os olhos, com o brilho do sol batendo na janela. — Tava bom demais para ser

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verdade! - falei em voz baixa, enquanto fecho a cortina e volto a dormir Acordei quase 10 horas da manhã, com a horrível sensação de ser trazida de volta à realidade, ou pior: à minha realidade. E por incrível que pareça, não há ninguém além de mim em casa; meu pai eu sei que está trabalhando, mas a esse horário, minha mãe devia estar aqui. Ligo a tv após tomar café, me jogo no sofá, e minha atenção está toda na programação, como fazia quando criança, sem celular, vendo meu desenho animado favorito, até que minha mãe entra em casa, com várias sacolas de supermercado em mãos. - Foi fazer compras hoje? Pensei que tivesse feito na segunda-feira! - falei colocando o controle na mesa de centro - O aniversário de casamento está chegando, quero preparar um jantar especial para o seu pai! - disse indo guardar as sacolas na cozinha - Esse ano não vão viajar, como todos os outros? Sempre comemoraram com uma viagem! - Esse ano é diferente, querida, decidimos não realizar uma viagem em que você não esteja presente. Fico olhando para ela por alguns instantes — Mãe, nós temos tempo… Não quero que por minha causa, vocês deixem de fazer algo que vem sendo feito há anos, apenas para passarem mais tempo comigo! - Não se trata de tempo, Anny… - sinto que ia continuar a falar, mas seus olhos se enchem de lágrimas e ela se vira para continuar guardando

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as compras — Vou terminar aqui, você pode me passar a última sacola? - perguntou evitando contato visual - Claro! - entrego o que me pediu — Eu prometo que vou ficar bem! - ela me olha ao ouvir minha voz — Se vocês forem, prometo me cuidar… Eu não vou morrer agora! - falei vendo-a ficar de pé Ela me abraçou tão forte e chorou, como nunca havia feito antes - e olha que já nos abraçamos muito parecia que o fato de irem viajar, era uma despedida, mas eu sei que não é; quando nos afastamos, eu sorrio em meio às lágrimas. - É a chance que tenho de passar mais tempo com o Brian! - brinquei - Eu devia ter imaginado! - ela sorri — Vou falar com o seu pai sobre a viagem, ok? - disse me dando um beijo na testa e continuando o que estava fazendo À noite, quando meu pai chegou em casa, eu estava no quarto, mas sei que conversaram e sem dúvida ele aceitou, já que veio até mim dizer que daqui 4 dias vão sair de viagem.

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Brian chegou, quando ainda faltava algumas horas para meus pais saírem de casa; - Estou confiando em você, para cuidar da Anny, Brian! - disse meu pai - Não se preocupe, senhor, eu não penso em decepcionar vocês, a Anny e eu vamos nos comportar! - ele sorriu e abraçou meus pais - E tem mais, Brian… Qualquer coisa, por menor que seja, você telefona para o médico da Anny, o número está na primeira gaveta, da mesa do escritório, e não deixe de nos avisar imediatamente! - minha mãe diz com ar de preocupação - Pode deixar, mas não vai acontecer nada! - ele responde e me olha franzindo a testa Assim que meus pais saem, Brian não deixa de mencionar o que minha mãe falou; - Sua mãe estava muito preocupada, você tem se sentido mal? - perguntou ele — Está doente? - Não, meu amor, é que ela é mãe, né?! Todas são assim! - respondo pensando na chance que tive de contar que na verdade, estou mais doente do que ele pode imaginar - Pode ser, mas ela parecia estar com mais medo que o normal, você não acha? - Por que insiste nisso? Eu já falei que me sinto bem, te chamei para me fazer companhia, não para questionar minha saúde, afinal, você não é médico! - falei me sentando no sofá e cruzando os braços

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Ele dá risada — Ah, não seja assim, vai… Eu só achei estranho, mas tudo bem, deve ser apenas preocupação de mãe! - disse se sentando ao meu lado e me abraçando pelos ombros — Gosto de você, até quando me trata assim! - Me desculpe! - sorrio enquanto encosto meus lábios nos dele — Não pense que estou com raiva, é que… - O que? - ele me interrompe — Eu sou um chato? Pode falar, eu aguento! - diz dando risada - Para! Você é incrivelmente maravilhoso, foi quem me trouxe de volta à vida e quando eu imaginei que tudo estava perdido, você me deu uma chance, Brian… A chance que já haviam tirado de mim! - quando paro de falar, me dou conta de tudo que acabei de dizer a ele, pois se fizer alguma pergunta, não vou poder explicar - Por que fala como se eu tivesse te tirado do fundo do poço? - perguntou me colocando de frente para ele — Seu passado te deixou muitos traumas? - O meu passado? Não, o meu futuro! - respondi deixando-o ainda mais confuso, e mesmo não sendo o que eu queria, não pude evitar a resposta Mas ao contrário do que imaginei, ele apenas me abraçou e concordou — É, minha Anny, pensar no futuro, assusta muito mais do que lembrar do passado! Ficamos sentados vendo um filme, até ele resolver fazer pipoca para acompanhar.

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Ele volta e me puxa para mais perto, fazendo com que me encoste em seu peito; - Por que escolheu esse filme? O casal não fica junto no final! - ele tira o controle da minha mão - Bom, a atriz é ótima e também retrata a realidade de muitos casais! - respondo tentando tomar o controle - Nada disso, eu vou procurar um que tenha um final feliz, como nós dois, esse aí quase me fez desacreditar no amor! - ele sorri enquanto procura outro filme No final do filme, como o Brian já estava quase dormindo, eu desliguei a tv e o chamei para o quarto. - Eu vou dormir com você? - perguntou com uma cara de atrevido — É melhor não, viu… - Por que não? - eu o puxei para subirmos a escada — Acho que tem espaço para você! Ele sorri e me beija — Você é perfeita, Anny Thompson! Assim que entramos no quarto, ele vai direto para a janela; - Acho que sou apaixonado por essa vista, quase tanto quanto sou por você! - ele abre totalmente a cortina Eu me aproximo e ficamos de pé abraçados, olhando a vista que tanto o hipnotiza, por tempo suficiente para minhas pernas começarem a doer. - Vamos dormir? - pedi, dando um beijo em seu rosto - Dormir? Não mesmo! Nós vamos fazer outra coisa… - disse fechando a cortina e me olhando - O que está fazendo? - perguntei

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Ele começou a tirar os dois cobertores que estavam em cima da cama e amarrá-los, na tentativa de deixar maior, em seguida, colocou-os na cabeceira, como se quisesse fazer uma espécie de cabana. - Por que está fazendo isso? - pergunto - Ainda é cedo, amor, e estamos sozinhos… O que um casal pode fazer de melhor, quando estão sozinhos? - perguntou levantando a sobrancelha — Contar histórias, conversar sobre a infância, o primeiro crush, primeira desilusão amorosa e essas coisas! - ele mesmo respondeu sorrindo — Vem, entra! - pediu levantando o cobertor A gente conversou e sorriu tanto, que quase fiquei sem ar, além da certeza de que o Brian me faz um bem inexplicável, como se a cada riso uma parte ruim fosse embora. - Eu amo estar com você! - falei em voz baixa - E eu mais ainda, meu amor! - ele me beija e me abraça até pegar no sono O Brian dormiu tanto, que quando acordou, eu já estava tomando café da manhã; ele chegou de mansinho e me tocou na cintura. - Te peguei! - disse sorrindo ao tentar me assustar - Eu te vi descendo a escada! - sorrio e dou um beijo em seu rosto — Fiz o seu café, me diz o que achou. Ele se sentou na cadeira ao meu lado e se serviu. - Olha, meu amor, eu não vou poder ficar o dia todo com você, tenho que treinar e realizar minhas tarefas diárias.

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Quanto a isso, não se preocupe! - falei — Eu tenho algumas coisas a fazer também! 1 hora depois, eu já estava sozinha em casa, e estar sozinha não me faz tão bem assim, sinto que penso com mais frequência na minha morte, na dor que vou causar aos meus pais e ao Brian, ainda que ele nem possa imaginar. Ele gosta de mim, seus beijos são sinceros e a forma como me contou sobre seus medos ontem a noite, mostra que confia em mim, que me tem como parte da sua vida, mas e eu? Eu não quero gostar tanto assim, na verdade não posso gostar, pois sempre que penso, vejo o Brian em um futuro no qual eu não faço mais parte. Fui para o escritório, fazer uma lista de coisas que seria bom realizar antes de morrer, ao invés de me prender por completo a um relacionamento, mas como é difícil fazer isso sozinha, liguei para a Dani, ela jamais me deixaria na mão; Quando chegou, vi que estava com uma sacola em mãos. - Eu trouxe lanche! - disse colocando na mesa de centro — Vem aqui, me dá um abraço! Nós nos abraçamos e ela parecia estar prestes a chorar, quando eu comecei a rir. - Do que está sorrindo? - Me desculpe, é que você é muito dramática, não pude controlar… - parei de falar quando vi que ela continuava séria - Você é minha melhor amiga, acha que posso sorrir de uma coisa dessa?

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Pode acreditar, não acho nada engraçado, eu só queria amenizar o clima de velório! - falei me jogando no sofá Dani tira o notebook da mochila e se senta ao meu lado; - Eu te inscrevi no concurso de canto, olha só a localização. - O que? - tiro o notebook de suas mãos para olhar mais de perto — Está louca? Eu sou péssima cantando! - Bom, a ideia é fazer coisas diferentes, não? Eu vou te ajudar a ensaiar, porque vai ser daqui a 4 dias! - diz com muita naturalidade - Amiga, olha só… Eu não canto! A ideia é curtir o máximo possível, sabe? Isso não inclui passar vergonha em público! - falei fechando o notebook enquanto ela dá risada - Ah, relaxa, a gente vai ensaiar muito! Eu vou até o escritório, pego o caderno que estou usando e abro na segunda página. - Toma, leia! - entrego a ela, que começa a fazer o que pedi - Escalar uma montanha, pular de paraquedas, nadar com tubarões… Você pirou de vez, Anny, acredite, é melhor participar do concurso! - O que teria de bom nisso? Quero levar comigo momentos divertidos, fazendo coisas que eu nunca faria antes por medo de morrer, Daniele, será que consegue me entender? Ela colocou a mão em meu joelho e me olhou nos olhos, com um brilho quase apagado — Consigo, mas e

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se trocar os tubarões por golfinhos? - eu sorrio com suas palavras e assinto com a cabeça - E se chamarmos a Tânia para sair? - Dani perguntou — Podemos ir à praia! - Claro, vamos! - respondo subindo para me arrumar Tânia ganhou dos pais, um automóvel de presente de aniversário, o que facilita suas saídas a qualquer hora do dia. - Meninas, o Umbro vai com a gente, tem algum problema? - perguntou Tânia assim que chegou - Claro que não! - respondo sorrindo, tendo quase certeza de que é seu namorado - Anny, eu soube do seu relacionamento com o Brian, ele gosta mesmo de você! - disse Tânia - Por que diz isso? - perguntei - Estive no treino do time dele, acredita que não quis saber de mim?! Ele deve estar apaixonado! Definitivamente não sei se fico feliz com o Brian ou irritada, com o fato da Tânia estar praticamente dizendo que deu em cima do meu namorado, mas não digo uma só palavra, afinal, eu não poderia esperar algo diferente vindo dela, mas pelo menos foi sincera. - Eu espero que você não esteja tão apaixonada quanto ele, amiga, porque o Umbro é um pedaço de mau caminho, não devia perder essa oportunidade. - disse ela - Pensei que fosse seu namorado! - Namorado? - ela dá risada — Para de ser boba, só ficamos uma vez, mas é sério, recomendo muito!

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Dani observou tudo sem abrir a boca, até que se aproximou do meu ouvido: — Nem pense nisso, tá me ouvindo? - E onde ele está agora? - Dani perguntou a Tânia - Já deve estar na praia, ele ficou de procurar o melhor lugar e nos esperar lá com o Renato e o Giovanni. Penso no que Tânia falou em relação ao Brian, mas o tal Umbro também despertou minha curiosidade. - Olha lá ele! - disse enquanto procurava uma vaga para estacionar - Onde? - perguntei olhando pela janela - É o que acabou de tirar a camisa, ao lado do Renato! - respondeu descendo do carro Paro um pouco para poder olhar sem ser notada e sim, eu diria que é uma bela visão. Renato logo se aproxima quando vê Dani, enquanto Tânia chega dando o maior beijo em Giovanni, me deixando sem jeito para cumprimentar Umbro, mas ele vem e me beija no rosto; - Você deve ser a Anny, não é?! - disse — Meu nome é Kayler, mas pode me chamar de Umbro! - Muito prazer! - digo com um sorriso — Pelo visto vamos segurar vela o dia inteiro! - olho para os casais se beijando ao nosso lado e dou risada - Só se você quiser! - ele coloca o braço ao redor do meu pescoço, quando estamos indo nos sentar na areia e eu consigo sentir o cheiro forte de álcool vindo dele Ele pegou uma bebida para cada um, mas a sua veio de um outro cooler, que fez questão de se sentar ao

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lado, enquanto eu, obviamente, me recuso a ingerir qualquer bebida alcoólica. - Sério que vai ser a única sóbria aqui? - Tânia perguntou — Vai, Umbro, faz ela beber alguma coisa! - disse puxando o Giovanni e correndo para o mar Ele me olha e sorri; - Toma, só finge! - disse em voz baixa, me entregando o copo e me fazendo rir — Eu fazia muito isso, até começar a beber de verdade e não parar mais! - Tem problema com a bebida? - perguntei - Eu diria que sim, considerando o meu histórico de acidentes! Eu apenas sorrio sem mostrar os dentes, enquanto ele fica de pé. - Quer dar um mergulho? - perguntou se equilibrando - Acho melhor não, não nado muito bem! Ele vai e Dani se abaixa para falar comigo. - Olha, você não inventa ficar com esse cara! - Claro que não, acha que eu sou louca?! Mas o Renato devia acompanhá-lo, ele acabou de dizer que tem problema com bebida e parece estar bêbado! - Ah, deixa ele, a gente vai para mais perto do mar, você quer ir? - perguntou me fazendo aceitar e segui-los Dani segurou minha mão, pois sabe que não sei nadar, mas não deixou de trocar carinho com o Renato, me

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deixando desconfortável, até que sinto uma mão na minha cintura. - Você tinha razão sobre segurar vela! - Umbro diz sorrindo - Triste realidade! - falei enquanto ele tirava a mão da Dani - Vamos deixar o casal namorar em paz, vem comigo! - me levantou do chão, me girando para o outro lado — Nossa, você é muito leve! Eu dou risada pela forma como falou e Dani me olhou séria; - Que você não saia daqui, Anny, estou falando sério! - pediu Dani Umbro me olhou e balançou a cabeça, voltando o olhar para Dani — Ninguém vai sair daqui! - falou ficando atrás de mim e me encostando nele Sua voz está embriagada, e eu não sei se são as ondas ou a bebida, quem está desequilibrando ele. - A gente vai acabar caindo! - falei - O segredo é ir um pouco mais para o fundo! Ele anda me segurando em sua frente, até estarmos mais distantes do Renato e da Daniele. - Viu só? Aqui está mais tranquilo! Sinto seu queixo frio vindo em direção ao meu pescoço e sinto que seu corpo ficou um pouco mais pesado, enquanto um de seus braços soltava minha cintura; - A Tânia acabou de sair da água! - falei tentando encontrar assunto Ele não disse nada, mas se afastou um pouco, colocando a mão na própria barriga e vomitou, sim, ele vomitou 5 centímetros de distância de mim, ou seja,

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fiquei ali parada, no meio do vômito que era trazido pela onda. Confesso que não tive tempo para ficar com nojo, já que acabei tendo que segurá-lo para que não caísse. - Desculpe, estou meio enjoado, acho que é pelo movimento das ondas! - disse visivelmente mal Eu gritei por Dani, que logo percebeu e mandou o Renato para nos ajudar. - Te falei para não sair de perto! - disse olhando para mim — O que é isso em suas costas? Que nojo! O pior dia da minha vida, na praia? Eu diria que sim! Umbro me olhou sem graça, mas parecia estar bem melhor agora. - Foi mal pelo constrangimento, Anny, de verdade! - Tudo bem, acontece! - respondo tocando em seu braço Dani e Renato caminham, e quando ficamos um pouco mais para trás, Umbro me beijou, sem que eu ao menos esperasse, seus braços me apertam enquanto tento me mexer, até parar de resistir, correspondendo seu beijo. Por um instante, não me importei com o Brian, nem sequer me lembrei dele enquanto sentia os lábios de Umbro nos meus, mas me afasto assim que ouço a voz de Dani; - Caramba, Anny, é sério isso? - Amiga, espera! - falei tentando me aproximar dela — Não é o que parece, ele sequer está sóbrio, foi uma bobagem! - Bobagem? - ela cruza os braços — É isso que vai dizer ao Brian?

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Brian é o seu namorado? - Umbro perguntou, logo atrás de mim - É um rapaz que diz gostar muito de mim! Dani não disse uma só palavra, porém, seu olhar me xingou em 5 idiomas diferentes; mas logo nos juntamos com Tânia e Giovanni, que estavam sentados ao lado do cooler. Umbro se sentou atrás de mim e encostou seu corpo no meu, enquanto pegava mais uma bebida; - Você tem um cheiro tão bom, Anny! - disse encostando o rosto em meu pescoço Eu não poderia dizer o mesmo dele, já que tudo que conseguia sentir, era o cheiro de álcool. - Tem certeza que é uma boa ideia continuar bebendo? - perguntei - Depende, vai cuidar de mim? - perguntou sorrindo Eu sorrio e ele pressiona os lábios contra os meus, de forma demorada, sem o menor receio. Tudo que eu devia fazer era afastá-lo, e deixar claro que tenho namorado, mas ao contrário disso, permito ser beijada, penso só em mim e no que estou sentindo no momento, ainda que eu vá me arrepender depois. O Brian não merece, mas também não posso me prender a alguém que me faz ter tanta esperança, que me faz querer fazer planos para o futuro e imaginar a vida que nunca vou ter… Eu não posso. - Vamos sair daqui? - Umbro sussurrou em meu ouvido

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Não! - falei em voz baixa — Você já bebeu demais! - tirei o copo de suas mãos e olhei para Dani que já estava me olhando Ela parecia estar tão decepcionada, que não pude encará-la por muito tempo, sentia vergonha cada vez que olhava em seus olhos. - Posso ser sincero? - perguntou — Estou louco para ficar sozinho com você, mas em outro lugar! - disse após beijar meu pescoço - Isso não vai acontecer, eu lamento! - falei me afastando e deixando claro para Dani que estava indo embora Obviamente ninguém entendeu o que aconteceu, muito menos Umbro, já que até então estávamos nos dando bem, mas a verdade é que não pude deixar de pensar no Brian e no quanto tem me respeitado, nesse momento me senti o pior ser humano do mundo, agindo da forma mais baixa possível, com alguém que desde o começo tem sido incrível.

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A primeira coisa que vejo quando estou chegando, é Brian em frente minha casa, com o celular na mão, mas ele só percebe minha presença, quando já estou ao seu lado. - Ah, aí está você! - ele me abraça — Estava te ligando agora mesmo, faz um tempão que cheguei! - Perdão, eu devia ter te avisado que ia à praia com a Dani! - digo abrindo a porta Ele tira a camisa assim que entra, segura minha mão e a beija; - Você se divertiu? - perguntou com um sorriso genuíno Eu subo a escada, sem dar uma resposta, por não conseguir olhar para ele. - Anny? Amor, o que houve? - pergunta indo atrás de mim - Vou tomar um banho, depois nos falamos! - bato a porta do banheiro antes que ele chegasse mais perto - É algum problema com seus pais? Eles te ligaram? Ouço sua voz do outro lado da porta, mas não respondo, sinto que se conversarmos, vou acabar contando o que aconteceu e ele vai me odiar. O medo de perdê-lo, me fez ter certeza de que quero o Brian sempre ao meu lado, mesmo sabendo que esse sempre será por pouco tempo. - Anny, olha só, se aconteceu alguma coisa, você pode me dizer, tá bom? Eu estou aqui, não

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precisa demorar no banho mais que o necessário! - disse se aproximando da porta - Já estou saindo! - abro e vejo que na verdade está sentado no chão bem ao lado da porta Ele se levanta e pega o secador que estava na mesa do closet; - Deixa que eu te ajudo a secar, assim a gente vai conversando! - disse passando a mão em meus cabelos — Foi chato seu passeio com a Dani? - Um pouco, aconteceram algumas coisas que normalmente não acontecem! - falei me sentando para que começasse a me ajudar - Ah, poxa, você devia ter me convidado então, tenho certeza que o dia teria sido incrível! Ficamos alguns minutos calados, até que Brian me olhou sério. - Seu pescoço está bem vermelho, o sol te castigou bastante! Quando terminou de falar, pude finalmente voltar a respirar, enquanto meu coração bate mais forte, me fazendo tirar o secador de suas mãos; - Eu posso terminar sozinha, é melhor você pedir algo para comermos! - falei mais rápido do que normalmente falo Ele se afasta e me encara por alguns segundos. - Você está linda com esse bronzeado, sabia? Eu sorrio e beijo seu rosto; - Ah, que beijinho sem graça! - diz dando risada e encostando os lábios nos meus — Assim está melhor!

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Me levantei para pegar o celular que estava tocando, mas travei ao não reconhecer o número. - O que houve? Atende, pode ser importante! - ele diz tentando clicar no verde - Não, deve ser engano! - respondo antes que ele tirasse o celular da minha mão e colocar no viva-voz {voz masculina} — Olá, estou ligando para confirmar a reserva no restaurante Alcaparras, às 8 da noite, no nome de Brian Gagliardi e Anny Thompson! {Brian} — Pode confirmar, obrigado pela gentileza! Ele me entregou o celular e ficou me olhando, como se quisesse perguntar algo, enquanto eu sorria mostrando alívio. - Era para ser uma surpresa, fiz a reserva quando estava a caminho, é o melhor restaurante da cidade, é bem difícil conseguir reserva, mas você parecia estar com medo de atender o telefone, amor… - Bom, é que… Por que deu meu número no restaurante? Pensei que fosse outra pessoa! - Só dei o número porque imaginei que fosse gostar, mas acho que não gostou muito! - ele se senta em minha cama - Gostei, na verdade gostei muito! - me sento ao seu lado segurando sua mão — Eu amo quando você está comigo! Ele sorri — Sempre diz isso, mas quer saber? Eu te amo, Anny Thompson, amo como nunca pude amar antes, amo sua família, seu carinho e sua sinceridade,

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eu nunca vou te enganar, é uma promessa! - ele me beija e eu não posso evitar as lágrimas - Por que está dizendo essas coisas? - perguntei passando a mão no rosto - Porque é a verdade, quero que tenha certeza do meu amor, eu nunca me perdoaria se… Não deixo ele continuar falando, coloco as mãos em seu rosto e o beijo. - Me ajuda a procurar a melhor roupa? Quero estar bem bonita! - Te ajudo, mesmo sabendo que você fica linda em qualquer roupa! - ele me abraça sorrindo Vejo tudo girar, quando ele me solta e tenho que me apoiar para não cair; - Está tudo bem? - perguntou me colocando sentada na cama e apoiando as mãos em meus joelhos — Tenho que ligar para seus pais? - Não, já passou! - digo forçando um sorriso - Meu amor, para com isso, vai… O que você tem? Me diga! - Nada, é sério… Deve ser porque não comi o suficiente hoje! - falei ficando de pé - Vou preparar alguma coisa, espera aí! - ele abre a porta do quarto - Não, Brian, é melhor ficar aqui comigo, posso aguentar até o jantar! Minha cabeça doía tanto, que me sentei novamente, mas fazendo o possível para não ficar tão evidente o motivo. - Deixa que eu escolho o que vai usar, pode ser? Confirmo com um sorriso;

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A recepção do restaurante é incrível, Brian reservou a mesa com vista para a janela de vidro, onde podemos ver as luzes da cidade e contemplar a brisa da noite. - Você gostou? - perguntou segurando minha mão - Eu amei, a vista é maravilhosa! - respondi colocando minha outra mão sob a dele - Você tirou o anel de compromisso? - perguntou puxando minha mão para perto - Sim, quando fui à praia, porque tive medo de perder! - falei fechando a mão imediatamente A verdade é que não faço ideia de onde esteja o anel, até o momento não havia percebido nada; - Ficou com ciúmes? - perguntei brincando para quebrar um pouco o clima - Ah, que isso… Eu sou 100% paz! - diz dando risada — Mas confesso que fiquei um pouquinho chateado, mas só um pouquinho! - ele pisca o olho sorrindo Eu sorrio e trago o rosto dele para mais perto do meu; quando estamos prestes a nos beijar, o garçom aparece para anotar o pedido. - Vamos querer um vinho, para acompanhar a entrada! - Brian diz voltando o olhar para mim, que assinto de forma discreta O garçom dá as costas e Brian volta a se aproximar da minha boca; — O que você planejava fazer, quando fomos interrompidos? - sussurrou me beijando - Você é tão diferente dos outros homens! - penso e acabo falando - Diferente como? - perguntou me olhando nos olhos

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Me ajeito na cadeira antes de falar; - Não sei, você me traz uma sensação boa, uma segurança, sinto que nossa conexão é muito além da carne, do sexo, sabe?! Você não é como os que só querem me levar para a cama! - Anny, olha para mim! - ele põe a mão no meu queixo — Não é que não queira fazer amor com você, conhecer cada parte do seu corpo, eu quero, quero muito, mas antes quero conhecer o mais profundo da sua alma e sentir o prazer que vem de dentro, porque quando falei que te amo, falei sério! Eu não paro de olhar para ele, seus olhos brilham, me fazendo sentir algo que nunca pensei que poderia, ele é tão seguro com as palavras, seu olhar é tão verdadeiro, que me faz querer parar o tempo. A forma como me olha é tão profunda, que parece conseguir enxergar os meus medos; - Vai, amor, diz para mim que também me ama, que eu não sinto tudo isso sozinho, diz! - ele me beija e depois pressiona os lábios em minha mão — Me diz! - Eu beijei outro homem… na praia… ele me beijou… e eu não quis impedi-lo de continuar. O Brian ficou tão quieto, que quase pude ouvir as batidas do seu coração, mas ele não se afastou, continuou sentado ao meu lado, minhas mãos ainda estavam nas suas, seus olhos continuavam fixos nos meus. - Fala alguma coisa, por favor! - peço em voz baixa, mas ele não abre a boca, continuou mudo

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Um silêncio constrangedor toma conta da mesa, tudo que consigo ouvir são as vozes de fundo e o garçom servindo o vinho que havíamos pedido. Brian sequer prestou atenção, estava imóvel até sua mão soltar a minha lentamente para segurar a taça; se recostou na cadeira, fazendo o vinho dar alguns giros na taça, antes de tomá-lo em um só gole. - Eu te amo, Brian! - tentei segurar sua mão enquanto ele colocava a taça na mesa — Juro que tive um motivo para agir assim, motivo que talvez você não compreenda agora, mas… O mesmo garçom volta para servir o prato principal. Brian está com o garfo e a faca em mãos, ele volta o olhar para mim e sorri apertando os lábios, me fazendo imaginar por um instante, que fosse usar a faca contra mim, mas ele apenas se ajeitou na cadeira; - Eu queria que nossa noite fosse agradável, Anny, então por favor, vamos aproveitar a comida, que está perfeita, está bem? - mesmo que esteja agindo friamente, seus olhos refletem dor, o brilho se apagou por completo Não sou capaz de dizer uma palavra, confesso que preferia que tivesse gritado ou dito algo sobre o que acabei de contar, mas ao contrário disso, Brian simplesmente parece ignorar os fatos e continua me tratando como se nada tivesse acontecido. - É uma bela vista, não é? - perguntou olhando pela janela — Escolhi esse lugar, porque é quase tão bonito quanto a vista da janela do seu quarto… Seu lugar favorito da casa, ou melhor, o nosso! - seu sorriso desaparece ao me olhar

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Ele segura minha mão e assim permanece por alguns segundos, depois serve mais uma taça de vinho; - Brinda comigo? - perguntou me entregando a taça - Á que vamos brindar? - perguntei - A todos os dias antes desse e a todos que virão depois! - disse fazendo o brinde Eu coloco a taça em cima da mesa, e olho para ele. - Juro que amo você, Brian! - segurei sua mão - Eu sei! - disse beijando minha mão — Você não precisa me convencer de nada, vamos esquecer o que aconteceu só por essa noite! Ele me beijou e eu tive a certeza de que nada poderia abalar nosso relacionamento, tirei um peso enorme da consciência, e agora mais do que nunca, quero tê-lo ao meu lado, sem imaginar o futuro, vivendo apenas o presente. - Seus pais voltam amanhã, não é? - perguntou se recostando na cadeira - Sim, amanhã à noite já devem estar em casa! Por quê? Questionei, mas ele voltou a ficar em silêncio tomando mais uma taça de vinho; - Por que nunca quis me levar para conhecer seus pais? - perguntei - Você não ia gostar, meu pai não é tão legal quanto o seu, minha mãe sim, mas trabalha bastante! - respondeu olhando para a janela O silêncio volta a tomar conta do ambiente, seus olhos fixos na janela de vidro, me fazem querer saber o que se passa em sua mente.

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Do nada Brian pede a conta, toma mais uma taça e estende a mão em minha direção; - Vamos? - pediu ao me ver confusa — A noite ainda não terminou! Enquanto ele buscava o carro, comecei a sentir que estava ficando paralisada, do nada ouço a buzina e consigo voltar a realidade. - Não estava me ouvindo? - Brian perguntou saindo do carro — Vou abrir para você! - Desculpe, é que acabei me distraindo! Brian dirigiu lentamente, mas ao contrário do que imaginei, não fomos para minha casa; ele estacionou embaixo de uma árvore, onde havia um lago artificial logo ao lado. - Eu adoro esse lugar! - disse se sentando no banco de madeira em frente — Sente só esse vento! - É incrível mesmo, mas está muito frio! - falei tentando segurar meus próprios braços - Vem aqui! - disse me abraçando forte — Eu te esquento! - ele sorri enquanto me beija Aparentemente não havia nada a fazer naquele lugar, além de apreciar a companhia um do outro e a bela vista que tínhamos em nossa frente. - Eu te amo, Brian! - falei em voz baixa olhando em seus olhos — Até essa manhã, eu não fazia ideia que te amava tanto assim! O sorriso voltou para os lábios, mas o olhar… O olhar não era o mesmo, por mais que ele quisesse esconder, a decepção era entregue por seus olhos.

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Era quase meia noite quando paramos em frente minha casa e ficamos conversando no carro, ele me abraçou muito, o que achei estranho, já que íamos passar mais uma noite juntos. - Vamos? - perguntei tirando o cinto de segurança e abrindo a porta — Vou abrir a garagem para você! - Espera, Anny! - ele me puxou pelo braço e me beijou — Agora pode ir! Desço sorrindo, abro o portão e uso o controle da garagem; Contudo, sem ao menos falar comigo, Brian ligou o carro e saiu… É, ele foi embora, sem mais explicações, sem gritos de "acabou" ou algo do tipo, ele apenas foi, não me culpou, não brigou, nem disse que me odeia. Não sabia exatamente o que fazer naquele momento; Peguei o celular para enviar uma mensagem, queria uma explicação, ainda que eu já soubesse o que estava acontecendo. A foto do seu perfil havia sumido, o visto por último também, ainda assim mandei mensagem, mesmo sabendo que não seria entregue. Meu coração bateu ainda mais forte, quando procurei seu nome nas outras redes sociais e não encontrei. Abro a janela do meu quarto, e me sento ao lado, não procuro mais explicações, afinal, já as tenho, mas não posso deixar de me sentir mal pela forma como acabou, por um instante tive a certeza de que Brian havia me entendido; mas quem entenderia algo assim? No seu lugar eu faria igual, ou até pior. - Será que ele agiria assim, se soubesse que tenho câncer e que por isso agi

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como uma idiota, querendo fazer tudo que jamais faria, caso tivesse uma vida inteira pela frente? - Pensei Eu precisava falar com ele, ouvir de seus lábios tudo que ficou guardado dentro dele, precisava lhe dar uma explicação, ou pelo menos dizer mais uma vez que agora sei que o amo de verdade, que sinto muito tê-lo magoado e que quero estar ao seu lado quando me for; Tudo isso é o que quero dizer, mas nunca direi. Não sei se todo esse mix de emoções ou apenas o tumor mandando sinais, mas comecei a me sentir enjoada, não como acontece quase todas as manhãs, dessa vez estava mais forte, me fazendo ir direto para o banheiro; não conseguia respirar direito, mas por incrível que pareça, minha cabeça não doía. Comecei a ficar assustada, liguei para Dani, que demorou um pouco para atender, devido ao horário. {Dani} — Oi, está tudo bem? - perguntou com voz de sono {Eu} — Preciso de um médico… Eu não quero morrer! {Dani} — Em 10 minutos estou chegando aí! Agora que acabei de sentir por um segundo como é não conseguir respirar, estou sentindo um medo terrível, que não sentia desde a chegada do Brian em minha vida. Meu corpo inteiro tremia, era uma mistura de frio e suor por todo o corpo, eu me esforçava para conseguir ver o que estava em minha frente, mas parecia impossível. Não sei o que aconteceu depois, acordei no quarto de hospital, com alguns aparelhos em minha cabeça e outros em meu tórax; pelo vidro da janela, posso ver através da cortina que o dia já amanheceu.

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Me assusto com a mão de Dani encostando na minha, ao me ver abrir os olhos. - Como está se sentindo? - perguntou em voz baixa — Eu já avisei os seus pais e também o Brian! - O Brian não, nós… Ele terminou ao saber que… - Para de falar, ele já me contou, mas não se preocupe, não contei a ele sobre o tumor! - disse segurando minha mão O médico entra no quarto, pedindo para ficar a sós comigo; - Anny, que bom te ver de olhos abertos, pode me dizer o nome dos seus pais? - perguntou - George Thompson e Iara Thompson! - Ótimo, e a amiga que acabara de sair? - Daniele! - respondo sem entender o que ele queria com todas essas perguntas - Okay! Anny, o tumor em seu cérebro está progredindo de forma bem lenta, sem grandes alterações, mas ainda devemos estar em alerta! - disse com alguns exames em mãos virando-os para mim — Veja, encontramos uma pequena gandula em seu estômago, e ela não estava lá nos últimos exames que fizemos… - Eu não quero morrer, doutor, não quero! - falei sem deixá-lo continuar — Por favor, tem que haver uma alternativa! Chorei tanto naquele momento que precisei ser sedada. Quando abri os olhos novamente, vi Brian de pé na porta, estava me olhando, sorriu quando me viu olhar para ele, seus olhos estavam cheios de lágrimas, o

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brilho havia voltado, e a medida que se aproximava da cama, as lágrimas desciam pela sua face; sem dizer uma palavra, me abraçou, chorando tanto quanto eu. - Eu tenho que te contar uma coisa! - avisei enquanto nos abraçávamos - Não, não importa o que você vá dizer, eu não quero te perder, Anny! - ele me beija e se senta na cama passando a mão em meu rosto — Eu não vou te deixar, ouviu bem?! Não importa o que você fez, mas sim o que faremos a partir de agora! - Me deixa te dizer o motivo de estar aqui, Brian, por favor… - Eu já sei, tá bom? Você teve uma crise de ansiedade, a Dani me contou tudo… Eu nunca devia ter te deixado sozinha! - disse segurando minha mão - Não, Brian, não foi nada disso, o que acontece é que eu… - a porta se abre e Dani aparece - Seus pais não vão demorar mais que 3 horas para estarem aqui! - Dani entra e fecha a porta Nós três ficamos em silêncio, até que Brian sai para tomar água e Dani se senta em seu lugar. - Por que disse que tive uma crise de ansiedade? - Ele estava muito nervoso, além disso não consegui pensar em outra coisa! - justificou - Que criatividade! - brinquei — Quer saber… para você eu posso confessar, estou com muito medo agora, Dani, muito mesmo! - Brian entra e me ouve falar do medo

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Por que, meu amor? - perguntou — Logo vai estar em casa, não há com que se preocupar agora! O brilho de seus olhos transmitem esperança, se todos me olhassem como ele, juro que não teria medo do futuro, ao contrário, eu iria ao seu encontro e torceria por um novo amanhecer, mas o olhar sem luz do médico, o falso brilho no olhar de Dani, me puxam para um futuro escuro e vazio. A porta é aberta por uma enfermeira; - Vocês vão ter que ir agora! - disse à Dani e Brian — O horário de visita é mais tarde! Dani me olhou, enquanto Brian se recostava na cadeira. - Eu não vou sair daqui! - disse olhando para Dani e para a enfermeira - É melhor você ir! - falei colocando a mão sob a dele — E peço que espere até que eu volte para casa, assim podemos conversar melhor sobre coisas importantes, principalmente sobre nós! - Não há nada mais importante do que estar com você, Anny Thompson, quero que saiba que o que aconteceu ontem, é como se não existisse mais, está bem? Vou me importar apenas com o que acontecer a partir de hoje! - Brian me beija e sai levando Dani com ele Hilda me entregou o remédio e permaneceu de pé ao lado da cama: - Esse é o Brian Gagliardi, não é? - perguntou - Sim, você o conhece? - Não exatamente, mas ele foi paciente do doutor Leon! - respondeu Hilda

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Doutor Leon é membro do grupo de apoio do conselho tutelar, e é estranho Brian ter sido seu paciente. - Paciente? - questionei — Como assim? - Isso mesmo, quando foi vítima de agressão pelo próprio pai! - ela diz e sai ao ser chamada Brian não fala muito sobre os pais, mas o pouco que sei é suficiente para não conseguir acreditar nisso, afinal, meu pai andou investigando e não deixaria algo assim passar despercebido. Enquanto penso, vejo os olhos de Brian aparecerem no pequeno vidro da porta; ele é teimoso e ainda não havia ido embora. A porta se abre devagar e ele passa por ela sem fazer barulho; - Eu disse que não ia sair daqui! - falou em voz baixa — Não me mande ir, tá bom? - ele sorri - Você é louco! - eu sorrio — Quando a Hilda voltar, vai acabar te colocando para fora! Ele se sentou na cama e segurou minha mão. - Não entendo o motivo de fazerem isso, foi só uma crise de ansiedade, não é? - perguntou - Quer saber a verdade, Brian? Não tem nada a ver com ansiedade, eu tenho… - meu pai abriu a porta de forma nada sutil - Meu Deus, você devia ter nos avisado antes, Brian! - ele diz ao se aproximar — Como você está, querida? - Pai, não se preocupe, o Brian não avisou porque estava comigo o tempo todo! - digo para evitar que Brian se justifique — Onde está a mamãe? Pensei que só fossem chegar daqui 3 horas! - Ela já vai entrar, está falando com o médico!

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Brian se levantou para que meu pai se sentasse ao meu lado; - Senhor Thompson, peço desculpas por isso, eu devia ter sido um pouco mais consciente, mas uma crise de ansiedade é sempre imprevisível, não é mesmo? - disse Brian Meu pai me olha e balança a cabeça, enquanto eu me mantenho calada. - É exatamente assim, Brian… Não se desculpe, fique tranquilo! - disse colocando a mão em seu ombro — Tem coisas que ninguém consegue evitar, ainda que queira muito! - quando a voz do meu pai começa a sair um pouco trêmula pela emoção, Brian o abraça Minha mãe entra secando o rosto e com os olhos cheios de lágrimas; - Ah meu amor, juro que nunca me senti tão aflita assim, desde a última vez em que estivemos aqui… Eu te amo, querida! - ela me beija na testa e não largou mais a minha mão - Também te amo, mamãe, te amo muito, mas não fique assim, nós ainda temos tempo, está bem? - eu sorrio ao falar com ela — Temos tempo! Brian nos olhava sem entender, seus olhos passavam por mim e meus pais, enquanto seu rosto tinha uma expressão diferente; em seguida seu celular toca e ele deixa o quarto. - Ele é um bom rapaz, - disse meu pai logo que Brian fechou a porta — E tem todo o direito de saber que não se trata apenas de uma crise de ansiedade!

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A essa altura não tem como pensar diferente do meu pai, mesmo que não seja fácil, não quero continuar escondendo do Brian algo tão sério, mas só em pensar nisso, sinto uma insegurança terrível, que me impede de ser completamente sincera; talvez eu esteja sendo egoísta, por levar em conta apenas meus sentimentos, mas não posso evitar, não conseguiria aguentar mais um olhar vazio, mas carregado de pena, principalmente vindo do Brian, que tem os olhos mais iluminados que eu já vi; apagar o brilho de seus olhos, seria como acabar com minha única esperança. Como não há motivos para continuar aqui, vou poder ir para casa, enquanto crio e recrio - em mente - a reação do Brian, ainda que eu sequer tenha pensado na melhor forma de falar. Estar em casa é sempre o melhor remédio, é quando me sinto eu mesmo, sem todas aquelas agulhas e aquele cheiro deprimente de hospital, que te lembra a cada 5 minutos o motivo de estar ali. Apesar de terem a viagem interrompida, sinto que meus pais estão mais tranquilos aqui, o que eu devia achar ótimo, se não sentisse que virei um peso na vida deles. Ter pais maravilhosos, uma amiga para todas as horas e um namorado que te faz feliz, é o sonho de qualquer garota, exceto quando a certeza de que eles jamais irão te machucar, te traz uma outra certeza: a de que você é quem irá machucá-los; totalmente sem querer, mas da forma mais cruel que alguém possa imaginar. Ainda que a morte seja inevitável e que no final todos tenham o mesmo destino, é impossível não imaginar que seremos causadores de feridas incuráveis, nas pessoas que

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mais amamos. E de acordo com o que os dias vão passando, sinto um medo perturbador, mas é incrível como estar perto do Brian faz com que tudo seja esquecido, como se não houvesse câncer, morte ou dor, apenas nós dois, um futuro claro e certo. Meu pai ainda insiste que o Brian precisa saber do meu real estado de saúde; sem dúvida é uma das coisas mais difíceis que já tive que fazer. Assim que ele entrou em minha casa, ao ser convidado pela minha mãe para jantar conosco, segurei em sua mão para subirmos até meu quarto, antes de servirem o jantar. - Você está tão séria, - disse se sentando na cama — Aconteceu alguma coisa? - Não, eu só… - parei ao ver que seu braço esquerdo estava marcado — O que houve com o seu braço? - perguntei levantando um pouco a manga da camisa - Acabei me machucando hoje pela manhã, mas está tudo bem! - respondeu afastando o braço - E como se machucou? - questionei - Treinando! - seu olhar era de quem não estava entendendo tantas perguntas sobre um simples machucado — Não é a primeira vez que acontece, você sabe… - Você jura, Brian? - cruzo os braços em sua frente — Não está escondendo algo? - Meu amor, sério… Qual é o seu problema? Não entendo tantos questionamentos, se quer saber alguma coisa, pode ser mais direta!

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Talvez eu só esteja querendo me desviar do assunto principal, mas depois do que Hilda me falou, não posso deixar de imaginar que o pai do Brian é um agressor. - O seu pai… foi ele quem fez isso? - perguntei quase sem abrir a boca - O que? - ele dá risada — De onde tirou essa ideia? - Você foi paciente do doutor Leon, Brian, o que quer que eu pense? - digo caminhando até a janela - Paciente do Leon? É, isso é verdade… - Está vendo? - interrompo — Você foi vítima de agressão pelo seu pai, a Hilda sabe desse episódio da sua vida. Ele não para de rir, enquanto eu falo sem parar; - Ah Anny Thompson, já pode respirar tranquila, o doutor Leon é meu pai! - disse me dando um beijo na testa e sorrindo Nunca me senti tão envergonhada antes, não pude continuar falando, apenas dou risada para diminuir o tamanho do mico. - Por que pensou que eu sofri algum tipo de agressão vindo do meu pai? - perguntou - A Hilda, ela… Bom, você sabe, ela me contou que você foi paciente dele, então acabei tirando minhas próprias conclusões! - pensei em falar que ela havia dito que ele chegou lá vítima do próprio pai, mas achei melhor evitar, afinal, o fato de ser seu pai, não tira a possibilidade da agressão ter sido verdadeira

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Ele não disse mais uma palavra, ficamos admirando a vista da janela, até minha mãe nos chamar para jantar. O Brian é tão doce, gentil, calmo e carinhoso, que é quase impossível imaginar que sua criação não tenha sido igual; - Papai, não acha que o Brian devia trazer os pais para nos apresentar? - perguntei enquanto servia meu prato - Bom, Brian, minha filha tem razão, seria um prazer recebê-los aqui! - disse meu pai Brian ficou tão incomodado que evitou nos olhar nos olhos, e deu apenas um pequeno sorriso. - A comida está perfeita, senhora Thompson! - diz após colocar a primeira garfada Minha mãe o agradece e me olha, percebendo o desconforto dele. - O pai do Brian é médico, sabia, mamãe?! - falei enquanto pego o guardanapo - Puxa, que legal! - disse ela — Deve ser muito ocupado, mas também um grande homem, a medicina é uma profissão muito nobre! Ele confirmou com a cabeça, dando um falso sorriso, evitando falar sobre os pais. Sua reação não quer dizer muita coisa, mas me deixou imaginando que no fundo posso ter alguma razão. Brian passou o restante do jantar, sem dizer uma palavra, enquanto meus pais conversavam sem parar; - Vamos subir? - perguntei colocando a mão em seu braço

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Assim que me levantei, tive que fazer uma pequena pausa para não cair, Brian percebeu e rapidamente me ajudou com a cadeira. - Você está bem? - perguntou colocando a mão em minha cintura, enquanto saímos da presença dos meus pais - Estou, mas tem uma coisa que preciso falar com você, ok? - digo subindo a escada Ele abre por completo a janela do meu quarto e puxa a poltrona para se sentar. - Você vai perguntar sobre meu pai? Se for isso, eu quero ser sincero contigo, Anny, - disse me puxando para mais perto — Ele é ótimo sendo médico, mas não é tão bom como pai, entende? Então sim, em algum momento da minha vida, esse episódio que te relataram, foi real, mas te garanto que não voltou a acontecer! A segurança na voz, não me fez duvidar, mas me fez ter certeza de que isso o deixa triste e só consigo pensar que quero muito vê-lo tendo uma boa relação com o pai; - Perdão por não ter sido sincero no primeiro momento em que tocou no assunto, tá bom? Só quero que saiba que esse tipo de problema não existe mais, tudo que tenho com ele agora, é uma relação fraca, só isso! - disse mexendo em meu cabelo - Eu sinto muito, de verdade… Não sabe como lamento ter trazido de volta esse sentimento, tudo que eu queria era te ajudar de alguma

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forma, porque sei como é importante ter os pais ao nosso lado. - eu o abraço e ele sorri - Você já me ajuda o suficiente, sabia? Não importa o que passei com meu pai, nada é mais importante do que o que temos agora! - disse me beijando — E tem mais, se quiser, amanhã te levo para conhecê-los! Não pude responder, pois estava tentando evitar que ele percebesse que eu não estava conseguindo ficar de pé, devido a dor de cabeça que havia voltado. - Está tremendo? - perguntou enquanto eu me segurava em seu ombro — Anny? Ei, olha para mim! - A minha cabeça… - falei apertando os olhos - Vem, vou te colocar na cama! - disse me guiando - Brian? - falo ao me sentar — Eu preciso que você saiba… - Você está doente, não é? - perguntou erguendo minha cabeça — Pode falar, meu amor, confia em mim, eu não vou te deixar, e se é isso que te preocupa, quero que saiba que vou cuidar de você até que esteja bem! Lágrimas rolam pelo meu rosto, não tive coragem de falar mais nada, apenas o abracei forte, enquanto ele me dizia que estava ali; - Se o destino quis que a gente se encontrasse, é porque sabia que nenhum problema seria grande o suficiente para nos separar, não é? Eu acredito nisso! - disse se recostando na cama e colocando minha cabeça em seu peito — Então

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para de imaginar que eu te abandonaria em um momento como esse, tá'? Só o que importa agora, é te ver bem e saudável, eu juro! Suas palavras não me acalmaram, sem querer fizeram com que eu me sentisse ainda pior; por mais que tente, ele nunca vai me ver totalmente bem. - Brian? - ele me olhou e continuei — Eu te amo muito! - falei em voz baixa - E eu mais ainda! - disse encostando os lábios nos meus Ele não foi para casa e meus pais não se importaram com o fato de termos dormido juntos, ao contrário, pela manhã nos acordaram para tomarmos o café da manhã com eles. - Acho que já tenho 100% de aprovação dos meus sogros! - disse sorrindo ao ver um de seus pratos favoritos na mesa - Parece que sim, mas é melhor não abusar ou vou acabar sentindo ciúmes! - damos risada Meu pai olha para Brian e volta o olhar para mim, fico um pouco tensa, pois sei que vai perguntar sobre eu ter conversado ou não, com o Brian sobre minha saúde. - Já contou para ele? - perguntou com o olhar fixo Brian me olha e em seguida confirma com a cabeça para o meu pai; - Sobre ela estar doente, não é? Conversamos um pouco ontem, e não quero que vocês se preocupem, vou cuidar muito bem dela, logo Anny se sentirá completamente bem! - disse segurando minha mão

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Meu pai apertou um pouco os lábios, franzindo a testa e olhando para mim; - É ótimo que seja um rapaz otimista, Brian, é realmente muito bom, mas o tumor no cérebro da minha filha, não pode ser operado, o risco seria de 99%, e os médicos disseram que não podem fazer mais nada. Enquanto meu pai falava, Brian ficava cada vez mais sério, até que largou minha mão e se recostou na cadeira. - Tumor no cérebro? - perguntou ao meu pai, que me olhou entendendo que eu não havia sido tão clara Minha mãe olha para o meu pai e se retira da mesa; Os olhos de Brian se enchem de lágrimas, ele coloca a mão na cabeça e volta a olhar para mim. - Você não vai morrer! - afirmou fazendo meu coração se partir ao meio — Diz que não é isso que vai acontecer, por favor, Anny… Diz! - Mas vai ficar tudo bem, eu prometo! - minha voz soa baixo e trêmula - Por que não me disse antes? - ele perguntou, mas não me deixou responder, seu abraço era tão desesperado que eu não conseguia falar, apenas chorar mais e mais — Não é assim que vai acabar, não pode ser assim, eu te amo o suficiente para não deixar isso acontecer! - Não há mais nada a fazer, meu amor! - digo tentando secar suas lágrimas — Eu ainda estou aqui, então apenas fique ao meu lado até o último momento, está bem? Por favor!

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Ninguém saiu de casa aquela manhã, pude ouvir minha mãe chorando na cozinha, enquanto eu estava no sofá com Brian, que parecia não querer sair de perto de mim; Seu rosto está completamente vermelho, os olhos além de inchados estão tristes e sombrios, o olhar que eu tanto temia, está me olhando nesse exato momento. Meu coração é esmagado todas as vezes em que ele me olha e uma lágrima cai de seus olhos; Os olhos mais brilhantes que eu já vi, estão totalmente nublados e não sei por quanto tempo vou aguentar, esses olhares são mais mortais que o tumor. - Não me olha assim, é só o que te peço! - falei em voz baixa — Por favor! - Eu não quero viver sem você, Anny, não quero e nem posso! - ele chora mais uma vez - Nós ainda temos tempo… Me ouviu bem? Não é o fim, eu tenho tempo! - tiro seu cabelo do rosto e sorrio — Vamos viver tudo o que nos for permitido, não precisa pensar no futuro agora, o presente é o que importa, então me promete que não vai mudar nada no nosso relacionamento? Você promete? - Eu prometo! - ele força um sorriso que vem acompanhado de um beijo Meu dia não poderia ter começado pior; minha mãe só precisava de uma reação como a do Brian, para que voltasse a desabar de vez, nesse momento, ela está vivendo tudo outra vez, como se acabasse de receber a notícia de que a filha está morrendo; por outro lado, meu pai demonstra uma força, que eu sei que ele não tem, mas é suficiente para não me deixar ainda pior.

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Brian me olha sério, não há mais lágrimas em seu rosto, sua mão ainda segura a minha; é um olhar triste, mas não veio carregado de pena, consigo ver no fundo de seus olhos, o brilho que tanto me deu vida. Sua outra mão adentra meus cabelos, ele sorri com os lábios e beija meu rosto; - Eu te amo, Anny Thompson, te amo o suficiente para te proporcionar os melhores dias da sua vida, mas quero que saiba que não vou desistir, ok? Por nada no mundo vou aceitar te perder, se existe 1% de chance, então vamos em busca desse 1%! - enquanto ele falava sua mão apertava a minha Seu olhar espera uma resposta, mas eu não digo uma palavra; não sei se quero me apegar mais à ideia de que ainda tenho 1% de chance, quando já aceitei minha sentença. - bom, aceitar não é bem a palavra Meu pai se senta ao meu lado, quando Brian me beija e sai pela porta da frente. - Me desculpe, querida! - disse encostando a cabeça na minha — Pensei que já havia contado a ele! - Tudo bem, papai, não se preocupe, foi melhor assim, eu jamais conseguiria! - sorrio e vou para meu quarto Com a janela completamente aberta, me sento com as pernas do lado de fora do quarto; nenhum medo de cair, nenhuma sensação passava pelo meu corpo, apenas vontade de escalar e conseguir enxergar toda essa vista mais de perto. Quanto mais contemplo o horizonte, maior é a certeza de que morrer tem sido a única coisa

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que literalmente me assusta, e vê o tempo passar me faz sentir mais medo ainda, algo que não se fazia tão presente no início, talvez por antes não ter sentido a morte tão perto assim. Volto à realidade quando ouço meu celular tocar; era Dani, me avisando que chegaria em alguns minutos, - provavelmente minha mãe já a deixou a par de tudo. Permaneço olhando o horizonte, mas agora sentada em minha poltrona, passando o celular de uma mão para a outra, até Dani finalmente abrir a porta do quarto e me abraçar por trás; - Estou muito orgulhosa de você! - disse beijando meu rosto — Sua força me inspira! - Por que? - pergunto dando risada — Não precisa dizer frases motivacionais só porque eu vou morrer, ainda tenho um tempinho, sabe? Não quero ser responsável por acabar com todas as suas frases existentes! Ela sorri e bate em meu ombro; - Caramba, que humor depreciativo! - damos risada enquanto ela puxa a outra poltrona - Você já deve saber, mas vou falar mesmo assim; o Brian já sabe de tudo! - falei erguendo os ombros lentamente - É, eu sei, mas como ele reagiu? - perguntou se recostando - Foi terrível, não tem como explicar o tamanho de sua dor e desespero, mas posso dizer que foi mil vezes mais doloroso para mim. Dani segurou minha mão e pude ver que uma lágrima estava prestes a cair de seus olhos.

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Ainda que eu não queira demonstrar, estou desanimada e não posso negar que grande parte da força que eu estava tendo, vem do Brian, que sempre foi o ponto de equilíbrio entre a minha realidade e o que eu gostaria que fosse, mas também não nego que o apoio de Dani é fundamental para eu ainda conseguir olhar para frente. Com as mãos ainda grudadas sorrimos, com os olhos carregados de lágrimas e nos abraçamos na tentativa de impedi-las de cair, mas foi inútil, choramos como nunca havíamos feito em todos esses anos de amizade. - Não ouse falar o que eu acho que pode está pensando, ok? - disse quando eu a olhei nos olhos e me afastei — Sem ouvir uma palavra, já dói tanto, amiga! - ela coloca a mão no rosto - Na verdade, eu só ia te chamar para dormir aqui hoje! - respondo sorrindo e fazendo-a dar risada - Bom, você sabe que se não me convidasse, eu mesmo me convidaria! - disse se jogando de costas na cama Nos assustamos com o toque do meu celular, enquanto dávamos risada; era o Brian, mas ignorei sua ligação, não que não quisesse falar com ele, eu sempre quero, mas a verdade é que esse é o meu momento de passar mais tempo com a minha melhor amiga, e podendo ser o último ou não, quero doar um pouco de mim à cada pessoa que eu amo e ela é uma delas. Ainda que eu vá, parte de mim tem que ficar, e ficará guardada dentro de cada coração que me conhece; - pelo menos, esse é o meu desejo -

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Dani saltou da cama, tirou da sua mochila uma caixinha de som e ligou no último volume; de repente me puxou pelo braço e começamos a dançar. Ela pulou, cantou e gritou tanto, que me fez sorrir até a minha barriga doer, mas sem deixar de acompanhá-la; minha cabeça dói todas as vezes que pulo, mas já não me importo, pois pela primeira vez depois de muito tempo, consigo sentir a felicidade de uma pessoa saudável. Nossas risadas atravessavam as paredes, mas só percebemos quando meu pai abriu a porta, para chamar nossa atenção, o que acabou sendo inútil, bastou que a porta fosse fechada novamente, para voltarmos a cantar a plenos pulmões; fazendo desta vez, minha mãe aparecer, mas ao contrário do meu pai, ela entrou na onda e segurando nossas mãos, pulou e cantou duas vezes mais alto. Assim que a música chegou ao fim, Dani e eu abraçamos minha mãe, nós três rimos e choramos ao mesmo tempo; não um choro de tristeza, nada disso, pelo menos para mim era de alegria, por estar vivendo um momento tão leve e especial, algo que talvez nunca volte a acontecer. Minha única certeza era de que o meu dia não terminaria tão feliz, eu sabia disso porque há meses aprendi a esperar sempre o pior, mesmo que ele sequer venha a acontecer; mas desta vez veio! Dani estava desligando o som, enquanto minha mãe abria a porta, e eu só senti minha cabeça batendo no chão do meu quarto, não foi um desmaio, eu posso ver e ouvir muito bem, mas não consigo sair do chão; ouço minha mãe gritar pelo meu pai, e sinto a mão de Dani embaixo do meu pescoço, mas não posso mantê-lo firme e muito

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menos falar, contudo, pude ver todo o processo, desde o momento em que meu pai me colocou em seu colo, até a nossa chegada ao hospital; consciente o caminho inteiro, sentindo o toque da minha mãe em meu rosto, e ouvindo meu pai falar baixinho ao telefone. Depois só consegui ouvir o barulho das rodinhas da maca pelo corredor do hospital, até finalmente ouvir a voz do meu médico se aproximando; me levaram rapidamente para fazer uma TC Craniana, e essa é a última coisa de que consigo me lembrar. Logo que abri os olhos, vi que Brian estava ao meu lado, meus pais já não estavam com a mesma roupa e Dani havia ido embora; eu sabia que podia falar, mas não quis arriscar, então apenas sorri para Brian, que em seguida me beijou. - Aí está você, Anny Thompson! - disse baixinho Eu não respondo, continuo sem abrir a boca, até minha mãe se aproximar e segurar minha mão; - Nós estamos aqui, querida! - disse ela Não havia um sorriso nos lábios dos meus pais, não pude olhá-los nos olhos, eu não quis olhar, mesmo que isso acabasse com os dois, fixei meus olhos aos olhos do Brian, pois me olhava sorrindo, mesmo que um sorriso forçado, mas ele sorria. - Não sai de perto de mim! - pedi a ele - Nunca, eu prometo! - respondeu Meu pai puxou minha mãe para o seu lado e saiu do quarto, deixando que o Brian e eu ficássemos a sós; - Quanto tempo fiquei inconsciente? - perguntei - 24 horas! - disse se sentando na cama — Seus pais não queriam te deixar um só minuto!

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Segurei sua mão e levei para o lado esquerdo do meu peito, enquanto arrumava seu cabelo com a outra; - Não há dúvidas de que à medida que o tempo passa, as coisas só vão piorando… Eu já sabia disso, mas não imaginei que seria tão doloroso assim, principalmente para as pessoas que amo, mas sabe o que é mais engraçado? - perguntei sorrindo apenas com os lábios - O que? - perguntou erguendo a sobrancelha - É que quando estou aqui, descubro que não quero morrer, mas… eu vou! Desta vez quem não respondeu foi ele, seus olhos se desviaram dos meus, Brian ficou de pé, senti que sairia do quarto, mas ele havia prometido que ficaria ao meu lado, e foi isso que fez, saindo apenas quando meus pais entraram com o médico para falar comigo. Com um total de zero novidades, o doutor me deu a má notícia que eu já estava esperando; o tumor está 3 cm maior, vou continuar tomando os remédios que me ajudam a suportar as dores, mas mesmo querendo que eu fique no hospital, não é isso que vai acontecer, pois não pretendo passar o resto dos meus dias em uma cama hospitalar, mesmo que isso me mate mais rápido. 5 dias é mais que suficiente, não vejo a hora de voltar para minha casa, mas é horrível imaginar que em alguns meses, você vai ser obrigado a se retirar do lugar que tanto quer ficar. Antes de voltar para casa, recebi a visita da mãe do Brian; logo que passou pela porta, tive certeza de que era ela, eu não me enganaria com aqueles olhos.

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Ele foi entrando em seguida, estava sorrindo, quando se pôs ao lado de sua mãe, para nos apresentar. - Essa é Anny Thompson, mamãe, a garota por quem estou apaixonado! - disse com o braço em seus ombros Ela anda em minha direção, o sorriso se abre a medida que se aproxima; - Que alegria te conhecer pessoalmente, Anny, há muito tempo tenho ouvido esse nome, já estava na hora de dar um rosto à ele! - disse me cumprimentando com um aperto de mão Brian puxou a poltrona para sua mãe e logo depois se sentou ao meu lado na cama; nós conversamos como se já nos conhecêssemos há anos, não foi difícil perceber de quem ele herdou toda essa simpatia. Fui convidada para jantar em sua casa, onde seu pai estará presente; confesso que não fiquei tão animada com o convite, acabei ficando um pouco nervosa, mas não tive coragem de recusar. - Não se preocupe, tenho certeza que meu pai vai amar você! - Brian diz ao perceber meu nervosismo - Não há dúvidas, querida! - disse a mãe dele Não posso afirmar com certeza, mas as palavras de Brian não condizem com a expressão em seu rosto; e após conhecer sua mãe, já não tenho certeza se quero conhecer o pai, só consigo imaginar que ao contrário do que foi com a senhora Gagliardi, não nos daríamos bem, talvez por eu ter criado uma imagem diferente do próprio.

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Diferente do que sempre acontece, desta vez minha mãe não me acompanhou na minha volta para casa, sequer deixou claro seus motivos, ela apenas não veio; meu pai fez o pagamento na recepção e voltou para o carro, me deixando parada há alguns metros; não sei se estava chateado, seu tom de voz era o mesmo, mas ele não estava mais tão cuidadoso. Não reclamei, entrei no carro e tudo parecia normal; - A mamãe está bem? - perguntei. — Pensei que ela viria! - Está tudo bem, ela preferiu adiantar o almoço e nos esperar em casa! - disse ligando o rádio A música que tocava era horrível, meu pai conhece o meu gosto musical, mas não fez questão de trocar a estação de rádio, ele apenas sorria da minha frustração. Mesmo que tudo parecesse normal, a minha mãe não estava ali; me senti culpada por passar todos esses dias no hospital, sem de fato lhe dar a atenção que merece, ou pelo menos olhá-la nos olhos ao invés de sempre desviar o olhar; é, agora posso imaginar o quão magoada ela deve estar. Deixando o carro parado em frente a nossa casa, meu pai saiu sem tirar a chave; minha mãe estava na sala, abriu um sorriso ao me ver, me deu um beijo na testa e continuou a colocar alguns livros na bolsa que estava em suas mãos. - O que é isso? - perguntei — Está escolhendo somente seus livros preferidos, você vai viajar? - Seu pai não te contou? - perguntou olhando para ele e logo voltando o olhar para mim

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Não entendi o que ela quis dizer, mas também não deixei que continuasse, a abracei forte; sem entender, me abraçou de volta. - Me perdoa, mamãe! - pedi sem soltá-la — Não quero que faça uma viagem chateada comigo! - O que está dizendo, querida? - perguntou levantando meu rosto com uma das mãos — Por que eu estaria chateada com você? - No hospital, sei que o momento não era um dos melhores, mas não é justificativa para eu ser tão fria e acabar te machucando a ponto de você não ir me buscar… Me desculpe, está bem? Eu só pensei em mim! - eu a abracei tanto que quase a impedi de falar - Espera, filha, olha… Eu jamais estive chateada com você, está bem?! Em um primeiro momento posso ter ficado magoada sim, mas sou sua mãe, te conheço melhor que qualquer pessoa, e além de conhecer, eu te entendo; - ela definitivamente não estava com raiva, mas não deixo de me sentir mal — Anny, querida, o meu amor de mãe não é vingativo, em momento algum, (o fato de não estar na sua saída) foi na intenção de te repreender, ao contrário, tive que ficar para organizar tudo, porque vamos passar uma semana fora, você, seu pai e eu! - minha mãe terminou sorrindo Não sei se ficava envergonhada ou feliz; eu dei risada e recolhi a lágrima que estava quase caindo. Minha mãe continuou me abraçando enquanto meu pai levava as coisas para o carro;

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Eles planejaram tudo, já haviam feito minha mala, só estavam me esperando; não tenho a menor ideia de onde estamos indo, mas suponho que seja uma viagem rápida, pois eu não conseguiria passar mais que 1 hora sentada no banco de um carro. Meu pai dirige por 15 minutos até chegar em um posto de combustível, o que é estranho, já que havia um há exatamente duas quadras da minha casa; mas não é tudo, após terminar ele estacionou, como se esperasse por alguém. - O que ainda estamos fazendo aqui? - perguntei - Não vamos demorar, querida! - disse meu pai Minha mãe tirou o celular da bolsa, digitou alguma coisa e o guardou; Não levou mais que 2 minutos para a porta do carro abrir e Brian aparecer do nada, me dando o maior susto. - Meu Deus, garoto! - falei dando um leve tapa em seu braço — Quase me mata de susto! Sua gargalhada toma conta do carro — Ah amor, me desculpe, mas você precisava ver seu rosto… Foi muito engraçado! - disse se ajeitando - Ah é? Mas o que está fazendo aqui? - perguntei - Achou mesmo que eu fosse ficar fora dessa viagem? Nada disso! Seus pais me convidaram, e como eu só preciso de uma desculpa para estar perto de você, aceitei sem pensar duas vezes! Ele me beijou sorrindo, tapando nossas bocas com a mão, para que meus pais não nos vissem através do espelho; mas logo ouvimos meu pai pigarrear algumas vezes, em uma tentativa engraçada de dizer que estava de olho, o que nos levou a rir sem parar.

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Não pude acreditar quando vi o resort que meu pai escolheu, era simplesmente maravilhoso; os quartos eram distantes um do outro, como uma espécie de bangalô, cada um com sua vista privilegiada, além de piscina com hidromassagem e um ar mais florestal. Brian e eu tivemos o quarto escolhido pela minha mãe, que fica a alguns metros do bangalô dos meus pais; - O que você fez para ela te deixar no mesmo quarto que eu? - perguntei brincando - Bom, para começar, eu acho que ela me adora, sabe?! - Brian diz sorrindo — Não vamos levar em consideração a parte em que eu tive que implorar! - disse colocando a mão no rosto Seu jeito fofo e engraçado me fez querer abraçá-lo, ficamos assim por um tempo, até perceber que não estávamos mais sorrindo, era apenas nossos corpos juntos, conectados o suficiente para eu conseguir decifrar cada batida de seu coração, ainda que ele sequer tivesse dito uma palavra. Brian têm o abraço apertado, e percebi que ele não queria me soltar, suas mãos apertam minha cintura, seu rosto permaneceu colado ao meu, até que me olhou nos olhos; - Não sei viver sem você! - disse encostando a testa na minha — O mundo não teria a menor graça sem você, Anny Thompson! - sussurrou - Eu ainda vou estar aqui, nunca irei para sempre, você vai ver! - falei passando a mão em seu cabelo - Você não pode ir, meu amor, seria como tirar de mim toda felicidade que sinto; felicidade que só

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existe quando você está ao meu lado! - disse com os lábios colados ao meu - Não vou embora, eu prometo! - falei em voz baixa — Será nos pequenos detalhes que você irá me encontrar, porque eu te amo muito, e além disso, também não quero ir! - digo com os olhos cheios de lágrimas Ele se afasta um pouco para me olhar nos olhos e sorrir com os lábios; - Eu te amo tanto que se pudesse, morreria no seu lugar, para que o mundo tivesse o privilégio de ter Anny Thompson vivendo nele por longos anos! Suas palavras soaram de forma tão tranquila, que eu sorria genuinamente; seus olhos continuavam brilhantes como sempre, ele segurava meu rosto como se estivesse segurando o seu mundo inteiro, seu polegar acariciava minha bochecha, enquanto nos beijávamos. A minha felicidade está tão completa, que eu não me importaria de morrer esta noite; às vezes vejo a sorte que tenho e simplesmente não acredito, veja bem: meus pais são os mais incríveis do mundo, eles não são perfeitos, longe disso, mas eu não consigo imaginar pais melhores; e o meu namorado? Meu Deus, não tem nem o que falar, é simplesmente maravilhoso! Mas com toda essa sorte, meu único azar é o tempo… o tempo que eu não tenho, mas que gostaria muito de ter. A frase que diz que só damos valor quando estamos perdendo, é totalmente verdadeira, nesse meio tempo, tenho olhado o mundo com outros olhos, coisas que eu nunca imaginei dar a mínima, se tornou peça importante

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na minha vida, o que eu achava inútil, me dei conta de que é completamente necessário. Eu nunca havia sido tão grata por tantas pequenas coisas, como o vento por exemplo: agora que sei que um dia vou deixar de senti-lo em minha pele, percebi o quanto o adoro. E acredite, é o mesmo vento que eu simplesmente odiava, pois costumava bagunçar o cabelo que levei horas para arrumar. - ah, se ao invés de irritada, eu tivesse o agradecido… Hoje gosto das pequenas coisas, vi que elas são mais interessantes, mais bonitas e estão ali por nós; o sol: ele sempre aparece, não importa quantas pessoas o odeia, nada é suficientemente grande para impedi-lo de brilhar. Eu amo o sol, mas também amo a chuva e tudo que vem do céu; não posso dizer que esse amor vem desde sempre, mas há alguns meses que me apaixonei por todos esses detalhes. Detalhes que estavam aí esse tempo todo, e que eu só estou dando valor por estar perdendo… A vida é incrivelmente linda, mas somente quando temos consciência de que vamos morrer e que cada dia é uma dádiva, antes disso, viver é apenas um fardo pesadíssimo. Meus pais se juntaram a nós, fomos para a área da piscina, meu pai colocou uma música baixa, trouxe alguns drinks, mas para mim um suco natural, Brian me abraçou pois eu estava com muito frio. - Você está com febre! - disse encostando o rosto ao meu - Eu sei, e tudo bem, a noite está incrível! - falei sorrindo com os lábios

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Eu sabia que estava chegando a hora, todos ali sabiam, sinto que por isso estamos fazendo essa viagem juntos, mas isso não me preocupa, estou ao lado das pessoas que mais amo no mundo, me sinto realizada e feliz. Brian não para de me olhar, seus olhos dizem que me ama o tempo inteiro, eu também o amo tanto que dói não tê-lo conhecido quando eu ainda tinha tempo; - Vamos entrar na piscina? - perguntei olhando para meus pais e depois para ele - Você vai sentir mais frio ainda! - disse Brian Mas nenhum dos três recusaram meu pedido; entramos e eu comecei a tremer muito, Brian me segurou, me colocou sentada em seu colo na escada da piscina, nos abraçamos enquanto olhávamos meus pais brincarem, foi a melhor cena que eu poderia ver, algo que jamais vou esquecer; a forma como se olhavam e sorriam me encheu de orgulho e de felicidade. Brian também estava feliz, mas era mínima a atenção que dava aos meus pais, ele sorria ao me ver sorrindo, se emocionou quando eu me emocionei, e não me soltou por nada; quando meu corpo se adaptou a temperatura da água, nos juntamos a eles, e de mãos dadas fizemos um círculo, onde giramos devagar por alguns segundos, cantando a música favorita da minha mãe. Estávamos esgotados quando voltamos para o quarto - Temos que tomar banho! - disse com cara de menino levado — Não podemos gastar muita água, por isso vou entrar com você, é para o bem do planeta! - disse dando risada

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Brian foi direto para a banheira comigo, me ajudou a lavar o cabelo, me fez massagem no pescoço e me beijou muito; - Para o bem do planeta, não é mesmo? - brinquei - Claro, meu amor, imagina ter que encher a bandeira duas vezes?! - disse piscando o olho Ele escolheu o pijama que eu devia vestir, e logo veio secar meu cabelo, o fato dele ser extremamente cuidadoso não me incomoda nem um pouco, eu seria capaz de viver duas vidas ao seu lado, sem mudar uma vírgula. - Eu te amo, Brian Gagliardi! - falei puxando-o para se deitar ao meu lado — Não esquece disso! - E eu te amo, Anny Thompson, amo tanto que é impossível eu amar outra pessoa igual, o que sinto é tão forte que só é possível sentir uma vez na vida! - ele encostou a testa na lateral da minha cabeça e depois trouxe lentamente seus lábios até os meus Me deitei em seu peito, ele puxou o cobertor até a altura do ombro, fez carinho em minhas costas até que eu pegasse no sono. Assim que o sol bateu à janela, me levantei devagar, fui até a nossa pequena cozinha privada, preparei o café da manhã, servi à mesa do lado de fora do bangalô e voltei para a cama; me sentei sem fazer barulho, puxei o cobertor até a cintura do Brian e o beijei. - Eu tenho uma surpresa! - falei em voz baixa Ele abriu os olhos e sorriu; - É tão cedo, amor! - disse com voz de sono

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Não demorou até me puxar para deitar ao seu lado novamente, me agarrou com força para que eu não saísse, enquanto eu dava risada. - Não temos tempo a perder, o dia está lindo, vamos? - falei ficando de pé ao lado da cama - Está bem, vamos! - respondeu saltando da cama — Você disse que preparou uma surpresa… Do que se trata? - Veja você mesmo! - segurei sua mão e o levei até a mesa Ele ficou parado por alguns segundos, com cara de bobo, mas logo veio me beijar; - Uau, que namorada maravilhosa eu tenho! Nos sentamos e fiquei atenta à sua expressão ao provar o que eu preparei; não dava para ter certeza, a única coisa que eu sabia, era que ele estava feliz, seu sorriso não negava. - Meu amor, esse é o melhor café da manhã que eu já tive na vida! - disse beijando minha mão - Jura que gostou? - perguntei tímida - Eu adorei, muito obrigado por isso, você é incrível! - falou sem largar minha mão Fiquei olhando para ele, seus olhos brilham, o sorriso não sai de seus lábios, e eu nunca me senti tão bem como agora; só o Brian tem esse poder de fazer com que eu me esqueça de tudo, e pense somente no hoje. Foi o café da manhã mais demorado de todos, em parte por querermos apreciar um pouco mais dessa vista maravilhosa, na companhia um do outro, já que em alguns minutos meus pais irão se juntar à nós, e provavelmente teremos uma bela aventura.

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Meu pai adora explorar, fazer trilhas e acampar, mas como acampar está fora da nossa lista, hoje planejamos uma trilha - bem longa; Brian tem os mesmos gostos que meu pai, nunca o vi tão animado para entrar na floresta onde Augusto, o guia, está nos levando. - Será que foi uma boa ideia? - perguntou minha mãe — Anny não devia se deslocar para uma distância tão grande! - Não se preocupe, mamãe, eu estou bem e adorei a ideia! - respondo sorrindo dando-lhe um beijo no rosto Brian logo se aproxima e tira a mochila que eu estava levando; - Me dê isso! - disse — Se em algum momento estiver cansada, não deixe de falar, está bem? - Meu Deus, eu adoro que vocês se importem comigo, mas a trilha é para ser divertida e não tem nada de divertido ficarem me checando há cada 5 minutos! - falei deixando-os para trás e indo para mais perto do meu pai Minha mãe pareceu não se importar com o que eu falei, e se juntou a mim novamente, mas o Brian não, ele se manteve um pouco mais distante, eu o olhava o tempo todo, enquanto ele conversava e sorria com o meu pai. Não há dúvidas de que se chateou, e não era isso que eu queria agora, então me aproximei segurando sua mão — Desculpe! - pedi encostando a cabeça em seu braço - Não precisa! - disse beijando minha testa — Eu só… Eu me importo com você, Anny, e se você não estiver bem, não tem diversão, então eu vou

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te checar há cada 5 minutos sim, não interessa o quanto isso vá te incomodar! - falou sério Não pude dizer mais nada, ele não estava bravo, mas também não estava brincando quando disse isso; por outro lado, eu amo seus cuidados, amo quando estamos um pouco mais distantes e ele me procura com o olhar… a verdade é que, não há nada que eu não ame nele. Brian segurou minha mão por todo o trajeto, até chegarmos a um riacho de água morna e muito clara. Éramos os únicos ali, mas Augusto deixou claro que em alguns minutos mais pessoas chegarão. Meu pai não é do tipo que gosta de dividir espaço com outras pessoas, então aproveitamos o tempo que tínhamos e seguimos adiante; o único problema é que eu estava muito, mas muito cansada, contudo, não a ponto de falar com alguém e estragar toda a diversão. Brian me trouxe uma garrafinha com água e logo parou em frente uma árvore alta, estava encantado, me fez parar junto a ele e sentar debaixo da sombra da árvore. - É incrível, não acha? - perguntou — O homem é incrivelmente idiota por querer destruir algo tão importante para ele mesmo, eles matam um pouco de si a cada árvore derrubada! - falou olhando para o topo - A árvore é incrível, mas você, meu amor, você é mais incrível ainda! - disse encostando os lábios nos seus - Está se sentindo melhor? - perguntou ficando de pé e me beijando — Não pode negar, amor, você está exausta, não é?

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Talvez um pouco, mas eu aguento! - falei sorrindo e piscando o olho — Não se preocupe, juro que se não aguentar, vou te avisar! Ele me olhou, balançou a cabeça e se virou de costas para mim; — Vamos, eu te levo! - disse fazendo sinal com a mão - Assim quem vai ficar cansado é você, não é uma boa ideia! - argumentei - Cansado, eu? - deu risada — Não brinca, garota, você conhece a minha força! - brincou Não aguentei, comecei a rir, e pulei em suas costas fazendo-o ir um pouco para frente. - Brian Gagliardi, você é maluquinho! - falei em meio a sorrisos enquanto ele corria para alcançar os demais - É, e você adora! - disse ele Não há dúvidas, eu realmente adoro, me sinto viva e livre de todo peso que existe em mim, a maluquice dele me faz um bem inexplicável. Meus pais estavam nos esperando mais a frente, Brian passou correndo por eles, para me mostrar toda sua força, o que não durou muito, tivemos que parar por alguns minutos, ele estava suado, ofegante e vermelho; eu comecei a dar risada, enquanto ele me olhava com o cabelo molhado de suor. - Não devia ter corrido! - falei passando a mão em seu rosto e sorrindo — Olha o seu estado! - Não estou cansado, o que acontece é que… ah você sabe, eu gosto de contemplar a natureza, por isso parei! - disse bem humorado - Está bem, eu acredito! - brinquei

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Augusto nos levou até o final da trilha, o caminho era mais fechado, fazia um frio terrível ao meio das árvores. A paisagem e o canto dos pássaros me encantaram; ficamos contemplando essa maravilha por quase 1 hora. - Eu amo o fato de você estar aqui comigo! - falei puxando Brian para perto - E eu mais ainda, meu amor! - disse me beijando Tê-lo por perto é a certeza de um dia bom. Quando voltamos para o bangalô, eu estava exausta, parecia que havia sido atropelada por 10 motocicletas, 5 carros e 2 camelos; tudo dói em meu corpo, minha cabeça parece que vai explodir, meu rosto queima como brasa, e eu começo a tremer sem sentir frio. Brian se deitou comigo, me abraçou forte e tentou amenizar o que estou sentindo, mas não funcionou, não desta vez. Eu podia ver o pavor nos olhos do meu pai, ele tem certeza que é sua culpa, por ter escolhido fazer a trilha, mas ele não imagina que se eu morrer hoje, não teria como ir mais feliz; depois que descobrimos o tumor, não tivemos momentos como esse, por um instante me lembrei da vida como era antes, do quanto nos divertimos e compartilhamos boas risadas. Teremos que antecipar nossa volta, amanhã estaremos em casa, terei que voltar ao hospital, onde vão me lembrar que estou morrendo; que é exatamente o que eu quero esquecer. - Não quero voltar agora, mamãe! - falei em voz baixa - Vai ser melhor, querida! - disse com a mão no meu rosto

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Essa viagem foi uma das únicas coisas que me fez lembrar de tudo como era antes, a presença do Brian só melhorou o que já era bom; voltar para casa significaria voltar à uma dura realidade, a qual eu não queria fazer parte. - Vocês podem fazer isso por mim, por favor, é só o que eu quero agora! - falei chorando — Eu estou bem, eu juro… Vamos ficar, por favor! - Não podemos continuar, você não está bem, filha, seria muito desgastante para você! - disse meu pai - Fiquem calmos! - pediu Brian — Vamos fazer o seguinte: se Anny estiver se sentindo melhor até o fim da noite, ficaremos e eu me encarrego de cuidar melhor dela durante todo o tempo, caso contrário, partiremos pela manhã! - sugeriu Claro que me esforcei para não parecer tão mal, ainda que tudo estivesse doendo, dei risada e concordei. Brian e eu não saímos da cama, meus pais vinham de 5 em 5 minutos para saber como eu estava, com a desculpa de trazer lanches. Posso dizer que estou bem, com medo, mas bem… Ficamos no quarto o dia todo, Brian contava piada, tentava me animar e me deu tanto carinho, que seria impossível não me sentir bem. - Sabe de uma coisa? Não me sinto tão mal por mim, sinto pelos meus pais, principalmente minha mãe, sou sua única filha… e ela não vai me ver casar , ter filhos ou com as primeiras rugas no rosto. Sinto que estou acabando com

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seus sonhos, sabe?! - falei encostando a cabeça no travesseiro - Tenho certeza que ela tem a filha que sempre sonhou! - respondeu Brian — Ela tem orgulho de ser sua mãe! Eu tenho total consciência de que minha mãe não me trocaria por uma filha que fosse viver mais, que fosse lhe dar netos, ou tivesse uma carreira de sucesso, mas se eu pudesse escolher ser essa filha, juro que seria. Os dias seguintes foram iguais, nada de trilha ou acampamento, apenas conversas agradáveis, roda de histórias e músicas; Brian repetiu sua música preferida cerca de cinco vezes. Viajar é maravilhoso, mas estar de volta ao aconchego do nosso lar, é melhor ainda. Voltar a deitar na minha cama, olhar o horizonte atrás da janela… nada disso tem preço! Amanhã voltarei a ver o médico, confesso que não sei o que penso quando estou prestes a passar por mais uma bateria de exames… a verdade é que eu penso fora da realidade, me imagino lá recebendo o resultado e o médico com uma expressão de felicidade, dizendo que finalmente a tortura acabou, que nunca mais vou ter que voltar a um hospital, pois estou curada. Seria pedir muito?! Eu sorrio ao imaginar, esse é o único motivo que me faz querer voltar, sinto que isso é o que tem motivado minha mãe também; vi que seus joelhos estão feridos, as madrugadas são sempre mais longas para ela.

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Como sempre, minha mãe me acompanhou ao hospital, hoje foi rápido e tranquilo, apesar do resultado não ser tão bom como gostaríamos, eu comecei a me sentir melhor, algo mudou dentro de mim, não sinto medo do futuro, estou feliz… Sim, eu estou muito feliz, a mesma felicidade de uma pessoa saudável e cheia de vida. Só quero ver o Brian, compartilhar com ele o que estou sentindo, é tudo que quero no momento. Minha mãe não entendia o motivo de toda essa alegria, a verdade é que nem eu conseguia entender. Eu abraçava minha mãe e ela sorria contente; antes de entrar no carro, mandei mensagem para o Brian, para nos encontrarmos na minha casa. Eu sabia que quando chegássemos, Brian já estaria lá me esperando; a primeira coisa que vi foi o carro de seu pai na porta da minha casa, mas não imaginei que daria de cara com o próprio assim que passasse pela porta. Brian aproximou-se, estava com um sorriso pequeno e um tanto tímido, mas me deu um beijo e se virou para o pai erguendo a mão. - Esse é o meu pai! - disse — Achei que fosse o momento ideal para se conhecerem! - Como vai, senhor Gagliardi? - o cumprimento - Ah, mas o que é isso?! Venha cá, me dê um abraço! - disse me puxando para perto Brian levou as mãos ao rosto; - Pai, por favor, a Anny não é muito fã de abraços, sabe?! É o jeito dela! - Brian diz com a mão em meu ombro - Tudo bem, amor, não tem problema, é ótimo poder finalmente conhecer o meu sogro!

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Não sei se já se falaram o suficiente, mas o meu pai está com cara de quem já o odeia, principalmente após ter seu vinho preferido sendo aberto sem permissão. - É lamentável saber que você está prestes a nos deixar, Anny, mas o importante é que você tenha vivido bons momentos, não é mesmo? Eu não sei como me sentiria no… - Já chega, pai! Será que não pode conter seus comentários? - Brian o interrompeu - Está tudo bem, eu vivi muitas coisas incríveis, e se Deus permitir vou ter tempo para viver muito mais! - falei segurando a mão de Brian - Viu só? Você foi o único que se incomodou com o meu comentário! - disse o senhor Gagliardi à Brian A verdade é que me incomodou sim, mas não o suficiente para acabar com meu dia, apesar de ter que ouvir esses tipos de comentários até ele finalmente ir embora. Brian ficou, mas estava envergonhado, pediu desculpas aos meus pais e a mim. - Nenhum pedido de desculpas vai ser suficiente para apagar esse momento, eu sei disso, mas sinto muito, meu amor, de verdade! - disse se recostando no sofá - Não seja bobo, ele não tem papas na língua, fala o que vem à telha, mas foi bom tê-lo conhecido! - falei beijando sua mão — Deu para perceber que vocês são muito diferentes! - Pelo menos isso! - sorriu — Eu não suporto quando ele fala que devo largar o futebol e

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tomar conta dos negócios da família… viu quantas vezes ele repetiu isso? - Sim, mas não tem porquê se importar, basta seguir seu coração, tapando os ouvidos para as críticas e mantendo o olhar fixo no caminho que quer trilhar. Eu amo te ver feliz fazendo o que gosta, é como se a tua felicidade fosse minha também! - falei encostando a cabeça no ombro dele Ele levantou um pouco o meu queixo — Obrigado por estar ao meu lado… Eu te amo tanto, Anny Thompson! - Eu mais ainda! - me ajeitei para colocar a cabeça em seu peito — Eu estou feliz, sabe? É uma paz que nunca mais havia sentido. Sinto que algo bom vai acontecer com a gente! - Jura? - perguntou abrindo um sorriso. — Ah meu amor, eu só desejo passar o resto da vida com você! - Nós vamos, agora sei que vamos! Senti uma paz gigante, com aquela sensação gostosa de tê-lo aqui comigo, pude imaginar um futuro tão lindo para nós dois, com a certeza de que tudo é possível, pois eu ainda tenho vida. Brian ficou mais algumas horas e foi para casa, disse que a noite voltaria; todas as vezes em que vai embora, torço pelo dia em que finalmente venha para ficar… sei que parece loucura, mas tudo que desejo no momento é ficar ao lado do Brian, juntamente com meus pais.

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Subi para o meu quarto após o jantar, já que Brian não ia demorar, eu quis me arrumar um pouco para recebê-lo. Fiquei alguns minutos olhando o céu através da janela, estava incrivelmente estrelado, algo me encantava mais que de costume; é o mesmo céu, as mesmas estrelas, porém, um tanto mais iluminados. Fechei as cortinas para não perder mais tempo, quando abri a porta do closet, não consegui ver mais nada, senti apenas meu corpo batendo ao chão e o frio do carpete em meu rosto. Não lembro de mais nada, tudo que sei é que voltei para o hospital, e cá estou eu mais uma vez… Eu sei que não é a última vez que estarei aqui, ainda tenho tempo, oito meses, não há oito meses ainda, por isso não estou com medo, e a sensação boa que se instalou em mim, me deixou com menos medo ainda. Eu não vou morrer! Na verdade vou, mas não hoje ou amanhã, eu sei que não vou, sabe como sei? É que eu consegui me enxergar no futuro! Brian entrou sem fazer barulho, imaginou que eu estivesse dormindo e não queria me acordar; - Oi, meu amor! - disse quando me viu de olhos abertos - Que bom que está aqui! - eu estendi a mão em direção a dele — Não fique tão preocupado, melhore essa cara, eu ainda estou aqui! - Ah, meu amor, não sabe como eu tive medo, por um instante pensei que você não fosse acordar, quase tive certeza que aquela seria nossa última conversa! - disse segurando minha mão

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Não chegou esse momento ainda, eu não estou pronta para a última vez! - falei em voz baixa Ele ficou me olhando por um tempo, depois soltou um sorriso bobo e disse: - Estava pensando na sorte que tive em te encontrar, muitas coisas mudaram em mim, sabia? - ele ficou sério de repente — Não sei se poderia voltar a viver em um mundo em que você não esteja presente! - disse segurando fortemente a minha mão - Você sabe que pode, as coisas vão continuar iguais! - tentei enxergar as lágrimas de seu rosto, mas ele interrompeu me beijando Seu coração batia tão forte, que eu pude sentir através de um breve abraço. - Não quero te ver chorando, é muito doloroso para mim! - Me desculpe, é que não consigo entender o porquê. Eu não quero ficar sem você, Anny Thompson, não quero! - disse encostando a cabeça na minha - Você não vai, amor, eu prometo! Brian estava com o olhar tão triste, que parecia estar em meio a uma despedida, mas não é o que sinto, para mim o momento não é esse, eu tenho tempo, é só mais uma internação, e ele ainda não se acostumou. - Eu te amo tanto, Anny Thompson! - diz com a voz embargada - Eu te amo mais, porém, não vou agir como as garotas dos filmes de romance que dizem: "quero que encontre uma garota legal, que se

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apaixone e seja feliz com ela" - brinquei — Eu mentiria se dissesse algo assim, o ciúme me deixa egoísta! - falei sorrindo — Mas tudo que quero é a sua felicidade, não interessa se será acompanhado ou sozinho, eu vou querer te ver bem, fazendo o que ama, e nada mais importa! Ele sorriu, chorou mais um pouco e voltou a sorrir; - Eu já encontrei a garota legal que me faz feliz, não vai existir outra por quem eu vá me apaixonar de novo! - falou me olhando nos olhos Eu o beijei, o beijei muito, muito mesmo, até que meus pais cruzaram a porta. - Interrompemos? - perguntou minha mãe dando risada Brian sorrindo se afasta; meu pai se encosta um pouco na lateral da cama e diz que a enfermeira voltará para medir minha temperatura, o médico também fará a visita ainda hoje. Logo depois, minha mãe entrega a chave do carro para Brian, dizendo que poderá usar para ir em casa tomar banho ou descansar um pouco; ele me olhou e sorriu apertando os lábios - Eu bem que preciso… não vou demorar, está bem? - disse me dando um beijo - Vai, meu amor, não se preocupe, vou estar aqui te esperando! - falei enquanto ele saía Horas depois o médico veio com zero novidades, vi que ficou conversando com meus pais assim que saiu do quarto, minha mãe abraçou desesperadamente meu pai, enquanto eu via tudo através do vidro. Sem dúvida a notícia não foi boa, senti meu coração apertado e

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meus olhos se enchendo de lágrimas; minha mãe não conseguiu esconder, veio logo me abraçar chorando. - Eu estou morrendo, não é? - pergunto, mas ela não consegue falar — Tudo bem, mamãe, vai ficar tudo bem, eu prometo! Não é fácil ser a fortaleza de alguém, quando seu peito está quase explodindo, e você se sente a pessoa mais perdida do mundo, mas pelos meus pais, eu estou tentando. Brian não demorou a voltar, estava chorando mais do que quando saiu; os três não quiseram sair do meu lado. - Eu te amo, Anny Thompson, nunca se esqueça disso! - Brian repetia essa mesma frase o tempo inteiro Meus pais seguraram minha mão, enquanto ele estava deitado na cama comigo; eu dormi o restante da noite toda. O dia amanheceu e eu ainda estou aqui, foi uma das minhas melhores noites de sono; trouxeram o café da manhã, Brian fez questão de me acompanhar, enquanto meus pais desceram ao refeitório. - Você está ótima, meu amor, seu rosto está mais vivo que nunca! - disse ele com alegria - Eu te amo, Brian, de verdade, não quero que duvide, porque mesmo que eu morra, o que sinto vai continuar vivo! - Nunca duvidei, meu amor, o que sentimos é verdadeiro, todos conseguem ver! - disse beijando minha testa Eu sorrio e encosto meus lábios nos dele;

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Minutos depois, senti minha cabeça doer, nada que me incomodasse tanto, mas achei melhor informá-lo e assim ele chamaria a enfermeira, que administraria os remédios, e foi exatamente o que ele fez; porém, o que parecia uma "dorzinha", se tornou uma dor quase insuportável, cada parte do meu corpo estava doendo. Quando Brian chegou com meus pais e a enfermeira, eu já gritava e usava o travesseiro para abafar o som. - Se acalme, querida, você vai ficar bem! - disse meu pai, tentando se enganar Brian não falava nada e minha mãe só chorava, eu não conseguia manter os olhos abertos por muito tempo, mas pude ver três pares de olhos cheios de aflição. - Eu não quero morrer, papai, não quero, mamãe! Brian? Eu te… Foi tudo o que eu disse um pouco antes de perder a consciência. Nenhuma palavra mais saiu dos meus lábios, tudo ficou escuro de repente, mas a verdade é que há sim aquela luz branca que todos falam, e eu segui por ela, mesmo não sendo minha vontade. E quando dizem que sua vida passa por seus olhos quando você está morrendo, também é verdade; pude ver em um flash, tudo de melhor que vivi com meus pais e com o meu amor. Confesso que não queira ir, não por mim, pois eu já estava cansada, mas sim por aqueles que deixei, pelo amor que eu tanto queria dar continuidade, e o orgulho que eu gostaria que meus pais sentissem; porém, tudo que os fiz sentir, são dores, logo agora que mais nada dói em mim.

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À medida que os meses se passam, minha mãe se afunda em suas próprias lágrimas, ela ainda não deu um sorriso desde o dia em que fui embora, sequer parece estar no mundo. Meu pai só trabalha, as piadas divertidas não existem mais, a casa está mais vazia, meu quarto ainda não foi aberto, não vão lá já faz um tempo; e eu torço para irem, precisam ir. O Brian, ele ficou quase um mês sem sair de casa, a primeira vez que saiu foi para ver meus pais, minha mãe foi quem o recebeu, e desta vez foi diferente, não teve Anny Thompson correndo em sua direção assim que o viu chegar, só existia o silêncio de duas pessoas que se esforçaram para não chorar na frente um do outro. Ele se sentou no sofá, mas logo em seguida subiu as escadas e parou em frente à porta do meu quarto, sua mão foi até a maçaneta duas vezes, mas parecia lhe faltar coragem para abrir; minha mãe se aproximou, colocou a mão em seu ombro e o deixou. Ele abriu, e tudo estava igual, a roupa de cama, as cortinas, os calçados jogados no canto e a roupa que eu usaria naquela noite; meu celular também estava lá, quase cem notificações, as quais nunca vou responder. Brian passou a mão em minha cama, puxou para si o travesseiro que ainda carrega meu cheiro e o abraçou como se estivesse me abraçando, mas quando ele chorou, o vento bateu à janela, sim, a nossa janela, e ele sentiu, tenho certeza que soube e foi a forma que encontrei para dizer a ele: Eu ainda estou aqui!

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Todos sabemos que depois de um ano, a dor já não é a mesma, o que não significa que fomos esquecidos, longe disso, os que ficaram apenas se acostumaram com a sua ausência física, e lentamente voltam a conduzir a vida, porque ela não pode parar. E agora, ao invés de chorarem ao se lembrarem de mim, eles sorriem, eu virei o assunto principal nas reuniões de família. Minha mãe entra em meu quarto todos os dias, passa horas sentada na minha cama, com a janela aberta e é o único momento que ainda a vejo derramar algumas lágrimas, mas sempre que sente a brisa entrando pela janela, rapidamente se recompõe e sorri, tem sido assim por quase um ano. Meu pai já consegue ficar em casa, ele voltou a fazer meu prato preferido no jantar e brinca com minha mãe sobre ser o dono da receita favorita da filha. Brian não deixou de ir a minha casa um só dia, sempre que sai do treino, é para lá que vai. Ele ainda não voltou a se relacionar, mas já conheceu uma garota, e teve seu primeiro encontro depois de mim, porém, foi a única vez que saiu com ela; e assim que a deixou em casa, ficou parado em frente à minha janela por longas horas, era como se seu coração ainda pertencesse à mim e tudo que envolve uma terceira pessoa, parece errado, são nessas horas que eu adoraria poder falar com ele; diria o quanto estou orgulhosa, e que esse foi um primeiro passo muito importante, pois mesmo que seja difícil, ele deve entender que o que vivemos, apesar de lindo, acabou, o tempo não pára e eu não vou mais voltar, outra pessoa vai ocupar o lugar que um dia foi

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meu, o vazio será preenchido e o brilho no olhar voltará a surgir. Pode demorar mais vai acontecer, no momento ele ainda faz questão de não me deixar sair do seu coração, mas eu não devo ocupar todo esse espaço; Brian me procura todos os dias, e mesmo que eu nunca mais possa senti-lo perto, ele me sente, o que precisa fazer é ir até meu quarto, o horizonte, a brisa, o céu, as nuvens… tudo isso nos conecta, o acalma, porque de alguma forma ele sabe que ainda estou aqui. Tudo, exatamente tudo, voltará ao normal, não só para ele, como para meus pais; eu ainda serei lembrada, e mesmo que essas lembranças sejam diminuídas com o tempo, sempre haverá o momento para falar sobre Anny Thompson.

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